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Papo Olímpico: Saudade que não sinto da infância

Arquivo Geral

06/11/2018 15h38

Flávia Saraiva conquistou o quinto lugar no Mundial de Doha, no Catar/Foto:Abelardo Mendes Jr./rededoesporte.gov.br

Breno Barros
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Quando criança, sempre que me perguntavam o que eu queria ser quando crescesse, a resposta estava na ponta da língua: adulto. E que fosse logo. Achava a infância chata, maçante. A minha foi tão maravilhosa quanto a de qualquer outro mentiroso. Deve ser por isso que não lembro de boa parte dela, um caso de amnésia seletiva.

A infância é mais bonita quando a gente fica mais velho. Li, na semana passada, que cientistas descobriram que crianças são capazes de gastar energia o dia todo sem ficar cansadas. Não precisava fazer gastar tempo e dinheiro com isso, bastava passar uma semana lá em casa com os meus dois filhos, de um ano e meio e outro de cinco, para comprovar a tese. De acordo com o estudo, os pequenos têm preparo físico comparável ao de atletas de alta performance de modalidade de resistência. Então, sou um ponto fora da curva: sempre tive preparo de jornalista.

Lembro que todas as minhas investidas no esporte foram frustrantes. Não era para menos. Ao completar 10 anos, eu tinha um corpo de sete. Quando cheguei aos 15, parecia que mal tinha completado 12. Tenho uma recordação, acredito que dos 13 anos: meu pai me colocou na escolinha de futebol no campão de terra da quadra 15, em Sobradinho. Acostumado a jogar golzinho na rua, foi a primeira vez que me aventurei em um campo tão grande.

Com meu porte físico raquítico, o treinador teve a ideia de me testar na lateral direita em meu primeiro jogo-treino. Depois de alguns minutos me escondendo em campo e vendo a bola de longe, um infeliz percebeu que eu estava próximo e me deu um passe perfeito. Abusado, dominei a bola e não pensei duas vezes: fui para o ataque.

Eu não contava que os outros garotos, todos maiores que eu, viriam correndo para tomar a bola. Nunca corri tanto na vida. Tudo por conta do medo de ser atropelado. Na minha cabeça, o lance futebolístico tinha virado questão de vida ou morte. Corri tanto que deixei a bola para trás e só parei no matagal que ficava depois do gol. Sobrevivi à jogada, mas foi a morte precoce da minha carreira de jogador.

Tudo isso para dizer que admiro, com espanto e respeito, crianças que dedicam horas a treinamento e repetições de movimentos. No geral, a infância é vivida sem horários, videogame, dormir e acordar tarde, e alimentação sem preocupação. Já para os que escolhem o esporte desde cedo, é preciso seguir uma alimentação regrada, uma rotina controlada, treinos intensos e, em geral, extensos.

A ginástica, por exemplo, é um esporte sinônimo de infância. Aos 20 e poucos anos, os atletas são considerados da terceira idade. A primeira vez que vi a ginasta Flávia Saraiva, ela já era uma veterana de 14 anos. Tinha jeito de criança, na estatura e na fala, mas quando entrava em ação não tinha para ninguém. Hoje, aos 19, ela é um grande nome do esporte nacional. No último fim de semana, ficou perto do pódio e terminou em quinto lugar no Campeonato Mundial de Ginástica Artística em Doha, no Catar. A única medalha do Brasil veio com Arthur Zanetti, 28 anos, que conquistou o quarto pódio em sete edições da competição. O paulista levou a prata nas argolas.

Flavinha e Zanetti tiveram que cumprir todo o protocolo de esforço e foco até chegar aqui. Todo atleta olímpico começou lá atrás, na infância, dedicando tempo e energia. Sempre gostei de pular e de não de cumprir etapas. Deve ser por isso que achava a infância chata. E é por isso também que não me tornei um atleta.

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