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Futebol

Profissionais combatem o machismo e falta de espaço no futebol

Arquivo Geral

16/11/2014 11h31

A auxiliar de arbitragem Fernanda Colombo Uliana trocou o quadro da Federação Catarinense de Futebol (FCF) pelo  da Fededação Pernambucana de Futebol (FPF) no início do mês. Nada de incomum no mundo do esporte. O motivo da mudança, no entanto, não ficou muito claro e trouxe questionamentos sobre a situação das mulheres no futebol brasileiro.

De acordo com o presidente da Federação Catarinense, Delfim de Pádua Peixoto Filho, em entrevista ao jornal Diário Catarinense, a auxiliar teria sido afastada   há cerca de três meses “por atitudes não condizentes com a profissão”. Ele afirmou, na ocasião, que ela estaria mais preocupada em ser “vedete”.

Para a presidente da Liga Brasileira de Futebol Feminino, Rose do Rio, a declaração de Delfim de Pádua reflete a maneira negativa como  as profissionais são tratadas neste  ambiente esportivo.  

Uliana,  que é aspirante ao quadro da  Fifa, foi alvo de comentários negativos em outras situações. Em maio deste ano, após cometer um erro em partida do Brasileirão entre Atlético-MG e Cruzeiro, ela foi duramente criticada pelo diretor do Raposa. Alexandre Mattos disparou: “se é bonitinha que vá posar para a  Playboy (revista  voltada ao público masculino)”. 

A própria auxiliar Fernanda Uliana reconhece o teor machista das afirmações do dirigente. “Quanto ao meu trabalho, ele poderia ter falado, mas justificar meu erro por uma questão física e de gênero foi demais. Com certeza foi um ato machista que o próprio reconheceu depois”, rebate. 

Ela acredita que o preconceito é potencializado quando erros são cometidos. “A mulher está conquistando cada vez mais espaço no futebol. Seja como atleta, árbitra ou torcedora. Mas existe discriminação, sim. Principalmente quando erramos.”

 
Trabalhar no meio é algo raro para ex-jogadoras

Rose do Rio acredita que a profissionalização do esporte feminino seria uma maneira de combater o machismo. “É só olhar para a situação do futebol feminino no Brasil. Não tem calendário, não tem campeonato. Quando tem, é   fajuto. O machismo continua. Sempre digo: esporte e  futebol no Brasil são masculinos”, opina.
 
Ex-jogadora da seleção brasileira, Marisa Pires Nogueira concorda com   Rose do Rio e ressalta que falta espaço para  ex-atletas. Ela diz que os cargos técnicos  dentro das federações e da própria Confederação Brasileira de Futebol (CBF) são majoritariamente ocupados por homens.
 
“As ex-atletas não têm oportunidade dentro das federações e  da CBF. Tem bandeirinha daquela época (década de 1980) que a gente não sabe nem por onde anda. É experiência jogada fora. Nunca deu para fazer do esporte uma profissão”.
 
Marisa, que jogou por 17 anos na seleção, 12 deles como capitã, hoje ganha a vida dando aulas de futebol para a terceira idade. Ela acredita que, além de profissionalizar o futebol feminino, é preciso criar um ambiente comandado por mulheres para deixar as companheiras mais à vontade. 
 
“Uma comissão técnica e arbitragem feminina. Isso nos dará mais espaço e reconhecimento. No exterior, o futebol feminino é profissionalizado. Eles imitam tudo que vem do exterior, menos isso”, ressalta. 
 
Poucos direitos garantidos

Em 2013, a presidenta Dilma Rousseff sancionou lei que regulamenta  a profissão dos árbitros de futebol. Eles passaram a ter o direito de se organizar em associações ou sindicatos. Além disso,  podem  prestar serviços às entidades esportivas no País. Mesmo assim, a lei não garante benefícios como aposentadoria, 13º salário e outros direitos trabalhistas. O tipo de contrato que estabelecerá a relação de trabalho não é definido. Na prática, os árbitros ainda não são empregados fixos das federações.
 
A auxiliar Fernanda Uliana acredita que isso faz com que muitos profissionais procurem outros empregos. “Somos obrigados a ter outra profissão. Modelo, por exemplo, é uma profissão que merece ser respeitada como as demais”, cobra.
 
Embora recorra a outras fontes de renda, Fernanda diz   que na Federação de Pernambuco encontrou o que acredita ser o mais próximo de uma profissionalização. “A gente possui uma comissão de arbitragem muito organizada que trabalha vários pilares: físico, técnico, psicológico, nutricional, social. É o mais próximo de uma profissionalização que já presenciei”.
 
“Se a profissão não está dando para suprir, elas têm mesmo é que procurar um complemento. Se for sair em capa de revista, que seja”, complementa a ex-jogadora Marisa Pires. 
 
Autora de cotas fala em inclusão

Para a deputada estadual Inês Pandeló, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, as declarações de Delfim de Pádua e de Alexandre Mattos reforçam o machismo dentro do esporte. “É um problema social e, dentro do futebol, não é diferente. Declarações como estas só contribuem para aumentar a falta de reconhecimento da mulher no esporte”.
 
Pandeló é autora da lei estadual que diz que programas de incentivo ao esporte mantidos pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro deverão reservar cota de 30% para mulheres. “É necessário incluí-las neste panorama. Podemos observar que o futebol feminino no Brasil não tem o mesmo apoio e recursos que o masculino.”
 
Saiba mais

Em julho deste ano, a Liga Brasileira de Futebol Feminino entregou à ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para Mulheres, um pedido para que fosse elaborado um projeto de lei que tornasse o futebol feminino uma profissão. Um dos objetivos é garantir   direitos trabalhistas.

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