Acompanhe, às quartas-feiras, uma série sobre iniciativas culturais fora do quadradinho.
Beatriz Castilho
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Uma área híbrida, com funções que refletem e contam a história da paixão pela arte – assim se apresenta a ManoObra. Instalado em uma região de chácaras de Sobradinho, o ambiente nasceu em 2005 como residência para José Ivacy de Souza e sua família, mas, em 2016, abriu as portas para o mundo como galeria.
Abraçar a arte foi algo natural. Com a produção e criação de um acervo pessoal, a casa ficou pequena e, um dia, se transformou em galpão, tempos depois assumindo o porto de uma galeria de arte.
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“Irmandade”
Para Ivacy, o nome ManoObra evidencia seu objetivo. “É uma composição e uma brincadeira poética com ‘mano’, de irmandade, e ‘obra’, de artesania, que, juntadas viram um ato político”, filosofa.
O diferencial, conta, é colocar em pauta a produção que não alcança espaços elitizados. “Muitas vezes, as pessoas têm grande linguagem poética, história e trajetória, mas não conseguem ser escolhidas pelas grandes galerias”, analisa. “Aqui inventamos nossa própria liberdade.”
Movimentação artística
O espaço, na visão de seu criador, é um reflexo da movimentação artística da cidade. “Não adianta você setorizar a arte, porque existem coisas que nascem no meio da população, nas ruas e no povo, e isso é um pouco do que aconteceu comigo”, relata.
São três andares, que se dividem em ambientes. A galeria fica no térreo, abrigando obras de Bené Fonteles, Arlindo Castro, Fernanda Pacca, Pedro Recroix, entre outros artistas. Andando por lá, é possível se divertir com vitrines que se misturam ao chão da sala. Entre pulos para certificar a segurança da base, José convida à aventura: “A sensação é de andar na piscina, né?”
Refúgio cultural
Apresentado como um refúgio da cidade, o espaço é rodeado por um jardim onde se cultivam gratas surpresas. Uma delas é a plantação de pau-brasil, espécie pela qual Ivacy tem um apreço reforçado a partir do dia em que descobriu que sua madeira material é boa para a fabricação de arcos de instrumentos de corda. “Resolvi me atentar a isso. Hoje passei a colher as sementes na época certa, além de fazer mudas para distribuir por aí. É como ter um olhar artístico sobre as coisas”, diz.
Descobrindo talentos em Sobradinho
Desde os oito anos, Ivacy demonstrava interesse pela arte. Os caminhos foram se desenhando. ”Virei professor de arte e comecei a desenvolver ateliês para experimentação”, conta.
De seus 56 anos de vida, 33 foram dedicados ao ensino na rede pública – atualmente, está afastado das salas de aula. Na última década como professor, ele teve contato com um campo da profissão que tomou um lugar especial em sua jornada: ensinar arte para jovens em escolas de altas habilidades de Sobradinho.
“São crianças muito talentosas que, na maioria das vezes, nunca tiveram acesso à informação e a materiais artísticos”, destaca.
Desenhos, esculturas e quadros doados pelos alunos ocupam o terceiro andar do local. Seguindo a demanda por arte que cresce em Sobradinho, a galeria ManoObra se revela abrigo, museu e recanto de atitude política.