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Brasília

Impasse leva Academia de Tênis do glamour à ruína

Arquivo Geral

07/03/2016 6h00

Jéssica Antunes

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Foram três décadas de glamour antes de cair em ruínas. Há seis anos de portões fechados, o abandono toma conta da Academia de Tênis José Farani, que em nada parece com o local de frenesi brasiliense da década de 1990. Um dos endereços mais valorizados da capital, à margem do Lago Paranoá, o complexo recebeu torneios internacionais de esporte, festivais de cinema e música  e foi reduto de políticos e empresários de grande porte. Mas o futuro  segue incerto. O governo diz que o projeto de reforma precisa de ajustes e  os empresários, que há excesso de burocracia.

As 21 quadras de tênis já não servem nem para treinos. As quatro piscinas estão vazias. Os seis restaurantes badalados que outrora enchiam os salões são apenas esqueletos. Os 226 apartamentos não recebem mais hospedes. No antigo cinema, destruído pelo fogo em junho de 2010, só restam lembranças das edições do Festival Internacional de Cinema que aconteceram em suas dez salas. 

O declínio  teve início em 2005, quando o então proprietário José Farani foi condenado pelo Tribunal Regional Federal a pagar   mais de R$ 100 milhões, relativos a   fraudes cometidas por explorar economicamente um espaço que era     entidade sem fins lucrativos. Ele adoeceu e morreu três anos depois. O fim, no entanto, aconteceu em 2010, quando o espaço mudou de mãos. Hoje, é propriedade da Attos Empreendimentos Imobiliários e do Grupo HC. 

Construção de hotel passa por polêmica

Quando a Academia de Tênis mudou de gestão, a promessa era de reforma, mas, de acordo com o Governo de Brasília, o projeto apresentado foi indeferido em 2014 “por ter mais características de um hotel do que de um clube, e a área é destinada a clubes, sendo obrigatória a maioria de instalações relacionadas a atividades esportivas”.

A Central de Aprovação de Projetos (CAP), da Secretaria de Gestão do Território e Habitação (Segeth), teria alertado para o fato e indicado uma série de exigências. Mas, desde então, o documento aguardaria a adequação dos grupos empresariais para dar continuidade ao processo. 

Burocracia

Sebastião Carvalho Neto, presidente do Grupo HC, que detém 50% do complexo, diz que uma reforma não depende dos empresários. “Todo o nosso trabalho tem sido no sentido de andar com toda a burocracia dentro do GDF. A primeira coisa que precisa é dizerem quais são as diretrizes da área e o que pode ser construído”, argumenta.

Sem aval nem prazo para funcionar

A respeito dos trâmites necessários para uma reforma, o empresário Sebastião Carvalho Neto confirma que, no Estudo Prévio de Viabilidade Técnica, estava ausente o Estudo de Impacto de Vizinhança, mas isso já estaria “basicamente concluído”, faltando apenas sua conclusão e a definição das diretrizes da área. 

“O plano é construir, dentro do que já existe, um   hotel de permanência demorada”, revela o presidente do Grupo HC.  No entanto, enquanto não houver aprovação de projeto, ele prefere não estimar prazo para funcionamento.

Diretrizes

O governo, porém, nega ausência de definição. “A área possui diretrizes estabelecidas por diferentes dispositivos: o Decreto  596 de 1.967, a decisão do CAU 15/76 de 11 de março 1.976 e Lei Complementar 730 de 24 de outubro de 2006”, informou a Secretaria de Habitação, em nota enviada à reportagem do Jornal de Brasília.  

Para vigorar essa última norma, esperada pelos empresários, ainda é necessária a regulamentação da lei. Segundo a pasta, o processo está em análise e, cumprida essa etapa, será convocada uma audiência pública, alterações necessárias serão feitas e, só então, o decreto regulamentador será publicado. 

Isso, porém, não impediria o projeto pela existência das demais diretrizes. 

Dois grandes complexos hoteleiros surgiram nas proximidades da Academia de Tênis enquanto ele se transformava em ruínas. São resorts com quase mil apartamentos cada, que são alugados tanto para moradia quanto para temporadas. 

Point do alto escalão

O mato alto, a estrutura enferrujada, a grama falhada  e os bolsões de terra já não serviriam para acomodar integrantes do alto escalão do governo. Fernando Henrique Cardoso,  Lula e Dilma Rousseff chegaram a morar ali, a última antes de assumir o mais alto posto da política brasileira. Ministros, secretários e presidentes de autarquias viveram ali enquanto não tinham residências definitivas no DF. 

O local, inclusive, teria sido palco de decisões importantes, como o Plano Collor,   debatido no quarto que a então ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Melo, mantinha no conjunto. Lula também participou de reuniões   e, em seu governo, 13 ministros moraram ali   até encontrarem moradia definitiva.

Grande perda para o esporte

Presidente da Federação Brasiliense de Tênis, Carlos Mamede lembra saudosista dos anos gloriosos do complexo: “A gente sempre utilizou os clubes para os torneios. Fazíamos uns 15 por ano e a maior parte era lá. Primeiro porque eram muitas quadras e depois porque não havia empecilho para sublocarmos as quadras. Mesmo que pegássemos dez, ainda sobravam várias”. 

Agora, diz, isso é complicado. “Foi e continua sendo uma perda muito grande. Fizemos torneios de grande porte até 2009, com cerca de 300 atletas. Trazíamos a Copa das Federações, o brasileiro individual. Podíamos colocar até 800 meninos. Hoje, temos que segmentar por falta de espaço, tanto que perdemos o torneio para Uberlândia”, lamenta. 

“Faz parte da vida”

A empresária Márcia Lima, 50 anos, diz lembrar com carinho e saudade do complexo. “Frequentava desde menina e passei por várias etapas da minha vida dentro da Academia de Tênis. Era um lugar muito glamoroso e de excelência, não só para jogar tênis”, conta. Festas, restaurantes, casamentos, leilões de antiguidade: as funções do espaço que hoje é abandonado quase não tinha limite. “Era o point de lazer da classe A”, define.   

“As coisas que aconteciam na cidade e no País passavam pela Academia de Tênis, onde frequentavam e moravam muitos políticos. Era fantástico!”, garante. Márcia diz que adorava o cinema, praticou esportes e esteve nos melhores restaurantes da cidade situados ali. “Ficamos muito tristes quando fechou. Foi um lugar que fez parte da vida de muitas pessoas”, lamenta.

Saiba mais

O Festival de Cinema sediado na Academia de Tênis em 2004  recebeu  Fernanda Montenegro, Claudio Torres, Fernando Torres e Fernanda Torres e, em 2006, a atriz Malu Mader. 

Em 2004, o velejador Robert Scheidt, campeão olímpico, também esteve no complexo.  

De acordo com Sebastião Carvalho Neto, detentor de metade do complexo, o local segue fechado para evitar depredação e uso indevido.  São gastos cerca de R$ 10 mil por mês para arcar com a vigilância.

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