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Brasília

Mortes por arma de fogo aumentam 41%

Arquivo Geral

15/05/2015 7h01

Jurana Lopes

Especial para o Jornal de Brasília

Em dez anos, o número de mortes   por disparos de arma de fogo no Distrito Federal aumentou 41,1%. É o que revela a nova edição do  Mapa da Violência 2015 – Mortes Matadas por Armas de Fogo. O levantamento é de autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz em conjunto com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Os dados são um comparativo entre os anos de 2002 e 2012.

Em 2002, o número de mortos por armas de fogo no DF foi de 569.  Dez anos depois,   saltou para 803, o que colocou a capital federal na oitava posição no ranking nacional. 

O estudo também mostra que houve um crescimento de 23,2% na quantidade de óbitos na população jovem do DF, subindo de  396  para 488.  Em todo o País, uma em cada duas vítimas de armas de fogo tinha   entre 15 e 29 anos. Além disso, 85% das mortes   foram causadas por revólver calibre  38, de fabricação nacional.

Negros

Os negros   são as principais vítimas das mortes provocadas por arma de fogo no Distrito Federal. Para se ter uma ideia, em 2002, a incidência de homicídios a cada cem mil habitantes  da cor branca era de 91 mortes. Entre  a população negra, a taxa era de 593 vítimas. Em 2012, o número de brancos assassinados caiu para 77, e a taxa de negros vítimas de homicídios subiu para 715.

O secretário nacional de Juventude, Gabriel Medina, explica que, no DF, um jovem negro tem seis vezes mais chance de morrer vítima de uma arma de fogo que um branco. Enquanto isso, a média nacional é de 2,5 vezes mais chance. Segundo ele, a capital federal lidera o ranking de desigualdade racial. 

“Somente um esforço conjunto de todo o governo pode reduzir essas taxas. O Mapa da Violência 2015 apresenta jovens e territórios específicos. Não se enfrenta a violência só com a polícia. É preciso combater o racismo, que é muito grande e tem causado a morte de muitos jovens negros”, afirma.

Na visão de Waiselfisz, autor do levantamento, o crescimento expressivo do percentual de jovens mortos   decorre da ausência de projetos   voltados  a eles. “O grande problema é que há todo um processo de abandono de políticas públicas dirigidas à juventude. A educação, por exemplo: nos últimos dez anos, o número de matrículas de jovens nas escolas praticamente permaneceu constante, não acompanhou o crescimento populacional. Tem muito jovem fora da escola, onde deveria estar”, avalia. 

Educação é fator determinante

De acordo com o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, vários levantamentos comprovaram que as pessoas com mais anos de estudo têm menos chance de serem mortas por   arma de fogo. “No ranking de países, por exemplo, o Japão, que possui uma população com elevado nível de estudo, aparece em último lugar. Por isso, é necessário aumentar o número de políticas públicas e tornar mais rígida a retirada de arma de fogo da população. Arma não dá segurança para ninguém”, destaca. 

Waiselfisz ressalta que, em uma briga, se houver uma arma de fogo envolvida, a chance de ocorrer  um óbito é grande. “Do contrário, se ninguém estiver armado, dificilmente haverá uma morte, pois é mais raro alguém morrer porque levou um soco”, exemplifica.

Dor de uma família

O irmão caçula de Ana Maria Soares, 24 anos, assistente de RH, faz parte da triste estatística   de jovens mortos no Distrito Federal por arma de fogo. Adriano Soares tinha apenas 16 anos quando foi assassinado, em abril de 2011. 

“Meu irmão pediu para que o bandido não levasse a bicicleta dele e, por causa disso, levou um tiro na testa. Acabou que o assassino fugiu e ainda deixou a bicicleta. Isso é revoltante. Se ele matou meu irmão por causa da bicicleta, por que não levou de uma vez?!”, questiona.

De acordo com Ana Maria, Adriano faria aniversário na semana seguinte, dia em que foi celebrada sua missa de sétimo dia. O assassino  foi preso depois de algumas semanas. “Não existe uma lei que realmente pune quem comete um crime como esse. O assassino do meu irmão estava cumprindo regime semiaberto quando o matou. Ele já tinha uma condenação de 20 anos e estava na rua. Agora, ele deve ser julgado, receber uma condenação de mais uns 30 anos, mas logo estará solto”, reclama. 

 

Ela completa dizendo que “até o delegado falou para a nossa família que era mais um criminoso vítima do sistema, oriundo de uma família desestruturada”.

Rotina após perda

Apesar de o assassino do irmão estar preso, a assistente de RH Ana Maria Soares desabafa:    nada ameniza a dor de sua família. Até hoje, eles  mantêm os pertences de Adriano como ele deixou. “Minha mãe não se desfez de nada. Ela troca o lençol de cama do quarto dele toda semana e visita o túmulo  em todas as datas comemorativas. É como se, para ela, ele fosse voltar. Meus pais vão ao quarto, olham as fotos dele, choram. O assassino está preso, mas isso não traz meu irmão de volta”, afirma.
 
Mão de Adriano, a dona de casa Rita Soares,   55 anos, passou um ano tomando medicamentos para conseguir dormir. Até hoje, se emociona ao falar do filho. “Adriano era um excelente rapaz: estudava, estava trabalhando. Era um garoto esforçado e obediente, nunca se envolveu em coisa errada. Eu nunca vou conseguir aceitar a morte dele. Tiraram a vida do Adriano de forma covarde”, lamenta.
 
Para Ana Maria, a sociedade ignora os jovens que estão abandonados na rua e isso tem de acabar para que haja uma redução no número de homicídios. “As pessoas não ligam para as crianças e adolescentes abandonados. É uma questão cultural. Aí, quando um deles se torna um criminoso  é que há uma preocupação. O problema é que a gente pensa que nunca vai acontecer. Quando ocorre é que passamos a ver as coisas de outra forma”, avalia. 
 
Para ela, é necessário criar outras maneiras de ressocialização, pois a atual  faz com que os jovens saiam da prisão muito piores.
 
Dados nacionais

A cada uma hora, cinco pessoas foram mortas por armas de fogo no Brasil em 2012. Ao todo, mais de 42,4 mil vidas foram perdidas após disparos   nos dias daquele ano, o equivalente a 116 óbitos por dia, segundo o levantamento do Mapa da Violência 2015. 
 
O estudo revela também que os jovens são as maiores vítimas das mortes por arma de fogo em 2012.  Das 42.416 pessoas que morreram no País em decorrência do disparo de algum tipo de arma de fogo, 24.882  foram de pessoas na faixa etária entre 15 e 29 anos, o equivalente a 59%.
 
Negros são maioria das vítimas no País

Em todo o País, entre as vítimas de disparo de qualquer tipo de arma de fogo, em 2012, 28.946 eram negras e 10.632, brancas. A diferença nos números mostra que a quantidade de vítimas desse tipo de morte foi 2,5 vezes maior entre negros do que entre brancos. 
 
Para cada grupo de cem mil habitantes, a taxa de vítimas da cor branca ficou em 11,8 óbitos, enquanto a de negros chegou a 28,5 mortes – diferença de 142%.

Desde 1980

Ainda de acordo com os dados do Mapa da Violência, entre os anos 1980 e 2012, mais de 880 mil pessoas morreram vítimas de disparo de arma de fogo. Esse número saltou de 8.710, em 1980, para 42.416 em 2012, um crescimento de 387%. A taxa de crescimento populacional no mesmo período foi de aproximadamente 60%. Os homicídios  cresceram cerca de 550% de 1980 a 2012.  
 
Jovens
 
Entre os jovens brasileiros, o panorama foi ainda mais preocupante: houve crescimento de 463,6% no número de vítimas de arma de fogo, que se explica pelo aumento de 655,5% dos jovens assassinados, de diversas formas,  ao longo do período.

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