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Brasília

Ilegalidade: vendem-se monografias

Arquivo Geral

26/04/2015 9h19

Jurana Lopes
Especial para o Jornal de Brasília

Desde o início da vida acadêmica, os estudantes do Ensino Superior são preparados para, ao final do curso, apresentar uma monografia ou um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)   relacionado à área de formação. O trabalho deve ser produzido única e exclusivamente pelos universitários. Pelo menos, essa é a regra nas instituições de ensino. Mas nem sempre isso acontece, pois há alunos que preferem pagar para não fazer.

Quem pensa que o mercado de produtores de TCC é pequeno se engana. Basta observar as faixas e os outdoors espalhados pelas vias do Distrito Federal, com anúncios com telefones de quem faz o trabalho. Há uma propaganda na Estrada Parque Indústria e Abastecimento (Epia), na altura da via que dá acesso ao Zoológico de Brasília. No Sudoeste, próximo à entrada do Parque da Cidade, há faixa com anúncio de elaboração de TCC. 

Na 710/910 Sul, é possível ver a propaganda em uma parede e, na 712/912 Sul, o anúncio está em um contêiner de lixo. Também é fácil achar esse tipo de trabalho especializado em classificados em jornais e internet. Os preços variam de acordo com o tempo solicitado pelo aluno e a complexidade do trabalho. E ainda há aqueles que fazem também dissertação de mestrado. 

Quem oferece o serviço aos estudantes faz desde correções no projeto até o trabalho por completo. As pessoas que fazem isso garantem que o texto é original e que utilizam ferramentas para que nenhuma parte do trabalho seja identificado pela banca como plágio. Uma empresa que faz o serviço informou que, se o universitário pedir, eles fazem tudo, inclusive acrescentar  referências bibliográficas de acordo com a área de formação. 

 

Outro discurso

Após a identificação da equipe de reportagem do JBr., o discurso foi outro. “Não fazemos o trabalho do aluno. Temos uma equipe de professores que orientam os estudantes sobre a redação e as normas da  Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), somente. Infelizmente, esse é um problema que nasce nas instituições por culpa de um ensino defasado. Então, os alunos procuram a nossa orientação”, afirmou a pessoa que atendeu à reportagem.

 

“Procura relativa”

Outro prestador de serviço da área informou que costuma cobrar a partir de R$ 1,5 mil por trabalho, dependendo do tempo. “Se me pedirem para fazer com um prazo muito apertado, o preço pode chegar a R$ 3 mil. Geralmente, eu faço o trabalho, e o aluno me ajuda pegando livros na faculdade e estudando o tema junto comigo. Se houver tempo, eu faço, e o aluno leva as etapas prontas para o orientador avaliar. Se tiver que mudar alguma coisa, eu faço a alteração”, revela. Ao Jornal de Brasília, o produtor de TCC disse que a procura por esse trabalho é relativa, mas que chega a fazer até quatro monografias por mês. Ele informou também que a maioria dos estudantes que procura seus serviço, não tem tempo para fazer o trabalho.

 

Há formas de desconfiar de trabalho

Dois dias para fazer uma monografia de 80 páginas. Essa é a promessa de um dos anúncios encontrados na 710/910 Sul. O prestador de serviços informou que segue a lei e que apenas orienta os estudantes que o procuram. Segundo ele, todo o trabalho é feito pelo aluno. A parte que lhe compete é ensinar como produzir a monografia ou o TCC em  dois dias. “Eu criei uma maneira de escrever rapidamente artigos e monografias. Então, o aluno me procura, eu faço um atendimento que dura cerca de 15 minutos e depois o aluno só retorna se tiver que fazer alguma alteração no trabalho. Cada atendimento custa R$ 300”, explica.

Renata Bittencourt, doutora em Educação e docente do Centro Universitário de Brasília (UniCeub), assegura que o orientador consegue perceber se foi o aluno que realmente fez o trabalho ou não. 

Como descobrir

 

“Quando existe uma orientação permanente, conseguimos identificar as cópias. Quando eu desconfio de alunos que estão pagando pela monografia, costumo conversar e solicito que algumas atividades sejam feitas presencialmente, como resumos sobre o trabalho. Dessa forma, o acadêmico vai ter certeza que não tem como ser aprovado por mim se realmente não tiver feito o trabalho final”, conta. A docente costuma orientar alunos de graduação e pós-graduação.

 

Reprovação ou reapresentação

A professora do  UniCeub Renata Bittencourt diz que alguns estudantes que tentam comprar o trabalho e percebem que não vão conseguir levar adiante a farsa acabam desistindo do trabalho. Renata desconfia que alguns casos de desistência tenham ocorrido por causa da sua maneira de agir.

A Universidade Católica de Brasília (UCB) informou que os procedimentos para análise do TCC estão ligados a cada banca de cada curso. Ou seja, o professor orientador e os demais membros da banca são responsáveis por verificar os casos de plágio. Eles utilizam um software específico na avaliação. Os estudantes pegos nesses casos são reprovados ou recebem outro prazo para reapresentação, definido pela banca examinadora.


Opinião

Para o estudante de Psicologia Mateus Lima, 20 anos, se um graduando paga para que o trabalho final seja feito é porque ele pretende jogar no lixo tudo o que aprendeu na faculdade. “Não é ilegal mandar outra pessoa fazer o TCC, mas isso é um atestado de mediocridade e interesse pessoal. Com certeza, isso vai influenciar no profissional que será no futuro porque mostra que o foco é se dar bem e ganhar dinheiro, sem um verdadeiro interesse pela área de formação”, avalia.

Para Amanda Soares, 19 anos, acadêmica de Enfermagem, a compra de monografia é uma falta de respeito do aluno para com ele mesmo. “Para fazer uma faculdade, gastam-se dinheiro, tempo, noites de sono. Se o estudante paga pelo trabalho final, ele joga fora tudo que ele investiu”, analisa. 

As estudantes de Direito  Camila Faria, 27, e Maynara Souza, 21,   colegas de turma, consideram que, se o estudante não teve a capacidade de fazer o TCC,   o que ele aprendeu no curso não vai valer nada e ele será um péssimo  profissional. “Além de não passar no exame da Ordem, no nosso caso, se a pessoa se tornar um servidor público vai achar que pode tudo, pois já conseguiu burlar o sistema”, salienta Camila.

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