O empréstimo com penhor de joias é um dos produtos mais antigos da Caixa Econômica Federal (CEF). Mesmo na era dos pré-aprovados, facilmente contratados pela internet, essa modalidade mantém seu espaço e muitos adeptos. Atualmente, existem 1,3 milhão de clientes com contratos dessa natureza, atingindo um saldo de R$ 1,7 bilhão no Brasil. Só no Distrito Federal, são 42 mil contratos, com saldo aproximado de R$ 78,8 milhões. O que pouca gente sabe é que, mesmo após ter uma joia leiloada por não pagamento do empréstimo, o dono ainda pode ter direito a um percentual do valor arrematado.
Procurados, CEF e Banco Central não quiseram informar o valor dessa quantia, que continua à espera do resgate dos clientes. Segundo informações de funcionários do banco, que preferiram não se identificar, o montante atinge cifras exorbitantes.
De acordo com a Caixa, o recebimento de parte do valor arrecadado em leilão só é possível, porém, quando a joia é arrematada por uma quantia superior ao valor da dívida. Apesar dessa possibilidade estar descrita em contrato, muitos clientes não leem direito o acordo e aca bam ignorando essa importante informação.
Segundo a instituição financeira, caso os beneficiários não sejam encontrados nos telefones e endereços cadastrados, o valor devido prescreve em favor do banco após cinco anos, situação que também está prevista nas cláusulas contratuais.
Experiência
A autônoma Valéria Melo, 43, desconhecia esse direito. Ela diz não ter sido comunicada, sequer, que a joia iria para leilão, muito menos que tinha um valor excedente para receber após o arremate. “Fiz o empréstimo com penhor porque havia fechado um restaurante e contraí algumas dívidas. Como estava com restrições no CPF, o banco só permitia que eu contratasse empréstimos com garantia”, explica.
Renovação pode ser feita várias vezes
Valéria Melo não conseguiu arcar com as parcelas e acabou tendo as joias leiloadas. “Não enviaram nenhum comunicado. Como as joias estavam em nome da minha mãe, ela só foi informada que tinha R$ 200 referentes ao arremate para receber quando foi à agência”, reclama a autônoma.
Em um ano de economia com ritmo mais lento, é natural que os consumidores busquem modalidades mais “baratas” de empréstimo. Nesse quesito, o penhor de joias sai na frente. Segundo a Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), essa modalidade tem juros de 1,9% ao mês, contra taxas médias de 5,9% praticadas em outras operações.
O montante a ser liberado no empréstimo depende da avaliação do ourives. Geralmente, é concedido algo entre 80% e 130% do valor da apreciação. O valor mínimo a ser contratado é de R$ 50. O pagamento pode ser feito em parcela única, com vencimento em até 180 dias, ou de forma parcelada, em até 60 meses. A renovação pode ocorrer em quantas vezes o cliente necessitar, pagando apenas os encargos.
Atenção para não perder bens
Em função das condições atrativas, o comerciante Otacílio José Nunes, 42 anos, também perdeu suas joias. “Penhorei um relógio e uma corrente que eram do meu avô e perdi”, lamenta. Como Otacílio não queria vendê-los, acreditou que o empréstimo seria uma boa forma de conseguir algum dinheiro sem se desfazer de seus bens.
“Acontece que as parcelas foram ficando insustentáveis e, quando vi, já havia perdido tudo. No fim das contas, as joias foram leiloadas a preço de banana e eu não consegui resolver meus problemas”, diz.
Liliane Leal, médica, 36 anos, teve um experiência diferente. Segundo ela, fazer empréstimos com penhor de joias é uma prática comum em sua família, que sempre deu certo. “Contratei um empréstimo no valor de R$ 5,6 mil em 2010, logo após me formar. Pouca gente sabe, mas, no começo da carreira, os hospitais particulares demoram até quatro meses para pagar os médicos. Como trabalhava em dois lugares, sendo um no interior de Goiás, estava difícil me deslocar de ônibus. Então, resolvi comprar um carro sem entrada”, lembra.
Ponto de vista
Segundo Edgard Monforte Melo, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão (FEA-RP), o endividamento do ano passado aumentou em relação a 2013. “Em função da desaceleração da economia, os consumidores estão em busca de um crédito mais em conta, com juros mais baixos”.
O professor de finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) Aguinaldo Pereira, por sua vez, avisa que a necessidade frequente de contrair empréstimos é um mau sinal. “Antes de recorrer ao crédito, é importante fazer um levantamento para ver qual é o salário líquido, quanto e com o que se gasta o dinheiro. Só depois deve-se tomar qualquer medida para ajudar no orçamento”, recomenda o especialista.
Cuidado para não pagar juros