“Muitas vezes, a gente deixa de se alimentar para pagar o aluguel. Aí, você tira da boca do seu filho pelo fato de não ter onde morar”, desabafa Fabrícia Carnauba, de 39 anos. Desempregada, mãe de quatro filhos, sendo um deles deficiente, ela vive hoje em Ceilândia Norte. A família engrossa o déficit habitacional do Distrito Federal, que chega a 32,5 mil moradias por ano, segundo a Secretaria de Gestão do Território e Habitação (Segeth). No último governo, apenas dez mil unidades foram entregues pelo Programa Morar Bem. Enquanto isso, mais de 350 mil inscritos, incluindo Fabrícia, aguardam pela casa própria.
Diante do cenário e da ausência de respostas, que espera há 14 anos, desde que fez sua inscrição na Codhab, Fabrícia sustenta a casa alugada do jeito que pode. Hoje, ela paga o valor mensal de R$ 560 pelo pequeno espaço, dinheiro que só consegue graças à ajuda do primo. “Fui à Codhab para reclamar porque tem gente solteira ganhando o lote. Jovens sem filhos com imóvel na mão”, diz a dona de casa, que abriu mão do emprego para cuidar da filha de 16 anos, portadora de deficiência mental.
Solução
O problema de Fabrícia e dos outros 350 mil inscritos no programa pode estar longe de ser resolvido. A intenção da atual gestão do GDF é entregar cerca de dez mil unidades habitacionais ainda neste ano. Contudo, salienta o diretor imobiliário da Codhab, Jorge Gutierrez, entre os desafios está “a obtenção de recursos financeiros para obras de infraestrutura”. Além disso, esclarece, “o processo de habilitação está passando por uma revisão geral, visto que foram detectados habilitados com renda superior à prevista nos programas.”
Invasões contribuem
A previsão, conta ainda o diretor imobiliário da Codhab, Jorge Gutierrez, é entregar, nos próximos meses, 112 unidades em Samambaia, 928 no Paranoá Parque e 2.304 no Parque do Riacho. “A Codhab está somando todos os esforços e estudos técnicos para entregar em 2015 praticamente a mesma quantidade de unidades habitacionais entregues nos últimos quatro anos”, frisa o diretor, que condena ainda as ocupações irregulares distribuídas no território do DF: “Para que um programa habitacional seja efetivo, as invasões devem ser integralmente evitadas, visto que interferem e atrasam a execução do planejamento habitacional realizado.”
Por isso, ressalta o diretor imobiliário da Companhia, a Agência de Fiscalização (Agefis) tem um papel importante na agilidade da entrega de unidades residenciais do programa Morar Bem: o de evitar novas invasões. O que, segundo a diretora-presidente do órgão, Bruna Pinheiro, vem sendo feito de acordo com as prioridades.
“Estamos pegando todos os arquivos e analisando, justamente para quantificarmos isso. Tenho o projeto original de Brasília que eu lanço em cima do Google e me dá uma noção do que está fora do planejamento. A partir daí, iniciamos o trabalho”, afirma.
Para ela, porém, o déficit habitacional no DF coopera para que aconteçam as ocupações irregulares. “Isso estimula a grilagem de terra pública e a invasões também”, diz. O que, para quem aguarda na interminável fila de espera do programa Morar Bem, faz sentido. É o caso da dona de casa Fabrícia Carnauba, de 39 anos, que está há 14 anos cadastrada no programa. “Eu não teria coragem de invadir, porque as pessoas que fazem isso correm muito risco. Mas não sou contra essas pessoas. A gente vê tanta irregularidade acontecendo”, opina.
Fila
Cansadas de esperar na fila do programa, mais de 3,4 mil pessoas fazem parte hoje de um grupo no Facebook chamado Morar Bem DF 2015. O criador da página, Esmael Braz, 52, conta que fez seu primeiro registro em programas habitacionais em 1988. “Aí, tive meus documentos roubados e fiz novamente minha inscrição no governo Cristovam. De lá para cá, se não me engano, são mais de 20 anos”, lembra o morador do Setor P Sul de Ceilândia.
A ideia do grupo é unir forças para buscar soluções do governo que, segundo o autônomo, insiste em não dar posições concretas. “É uma enrolação. Você vai lá, liga e ninguém sabe nada”, relata.