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Brasília

MP busca solução para polêmica na Cidade Ocidental

Arquivo Geral

23/11/2014 9h59

A disputa por uma área equivalente a 4,2 mil hectares, em Cidade Ocidental (GO), ganhou um importante componente: a intervenção do Ministério Público Federal. O MPF promete dar fim ao impasse que se arrasta desde 2006. Para isso, o procurador da República Onésio Soares Amaral iniciou um ciclo de audiências públicas com a participação da comunidade, situada na Região Metropolitana.

O que seria um ganho, a intervenção do MPF no caso se transformou em queixa: tanto dos supostos descendentes de quilombolas – integrantes de uma associação que reivindica o reconhecimento e a desapropriação da terra – quanto os donos de propriedades da região reclamaram do dia e horário da audiência pública, além da falta de divulgação do evento, que ocorreu na manhã de uma segunda-feira (17 de novembro). 

O procurador Onésio Soares afirmou, no entanto, que haverá outras audiências e que a do último dia 17 foi apenas um “primeiro contato” com as partes interessadas no processo de desapropriação da terra homologado no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). 

“Viemos colher a opinião da comunidade. Vamos buscar encontrar uma solução conjunta e consensual para resolver essa questão. Temos os instrumentos e o dever legal de agir”, afirmou Onésio. “Mas não vai ser aqui hoje. Esse é o primeiro contato”, emendou o procurador.

Onésio Soares visitou a comunidade e percorreu outras propriedades particulares instaladas nas proximidades da região. Entre as quais, o Residencial Damha, que o próprio procurador afirmou não estar dentro da área requerida pelos quilombolas.

Decreto

O advogado Albiléo da Costa Santos faz críticas ao Decreto Presidencial 4.887, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. “Qualquer um que se denominar descendente de quilombolas é aceito. Não precisa comprovar”, afirma.

Os proprietários de lotes, áreas e investidores da localidade contestam a afirmação de que a antiga fazenda Mesquita seja propriedade quilombolas. Para eles, não há descendentes de escravos que validem a reivindicação da associação, requerendo o direito àquela terra. As 785 famílias temem perder suas moradias, onde muitas já residem há mais de 30 anos.

A professora Sarah Bundin, 34, mora há 15 anos na comunidade e também discorda da existência de descendentes quilombolas na região. “Não está certo a gente ficar à mercê da associação. Estou temerosa quanto ao futuro da minha residência”, afirma.

Origem das terras documentada

A Fazenda Mesquita, segundo consta no Registro Paroquial 126 da Diocese de Santa Luzia, hoje Luziânia (GO), foi adquirida em 27 de janeiro de 1855 por Delfino Pereira Braga, que na época era o tesoureiro da Igreja do Rosário, por compra feita a Delfino Machado. Desde aquela época, por sucessão, essa fazenda se manteve sob o domínio e posse desta tradicional família Pereira Braga, sendo que alguns dos sucessores optaram por vender seus respectivos quinhões a terceiros e, assim, a propriedade está atualmente sob o domínio e posse de diversas pessoas, remanescendo aos descendentes da família Pereira Braga, segundo levantamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), um total de 761 hectares. 

De acordo com a legislação vigente naquela época, antes de 1854, quando o registro paroquial passou a ser exigido aos proprietários de terras no Brasil, não havia legitimidade em qualquer tipo de doação de terras no País, tendo em vista a inexistência de titularidade.

Doação

A informação deixa sob supeição o argumento do processo no Incra que embasa o pedido de reintegração da terra à comunidade quilombola: “(…) duas irmãs escravas teriam ganhado de um tal senhor João Mesquita a fazenda Mesquita – isso teria sido entre os anos de 1800 e 1840”. 

Para manter a propriedade no domínio da família, Delfino impôs aos seus descendentes que se casassem com membros do clã. A grande maioria das pessoas que se denomina quilombola e reivindica a desapropriação do terreno tem parentesco direto ou leva o sobrenome Pereira Braga na Certidão de Nascimento.

Frações

No processo montado no Incra, há a informação de que, ao longo desses 150 anos, inúmeras frações de terras foram vendidas a terceiros por livre e espontânea vontade dos parentes. 

Remanescentes da família Pereira Braga ainda moram no Povoado de Mesquita. Eles estão em uma pequena fração de 761,257 hectares, que também é alvo da iminente desapropriação, por estar dentro dos aproximadamente 4,2 mil hectares requeridos pelos supostos descendentes quilombolas.

Loteamento

Em uma dessas operações, surgiu o loteamento denominado Jardim Edite. De acordo com a transcrição número 15.494 do Cartório de Registro de Imóveis de Luziânia, Isidória Pereira Braga e seu marido Antônio Lisboa da Costa, em 26 de agosto de 1960, vendeu a Duilio Spiandorim uma área de 136,80 hectares na Fazenda Mesquita. Em 15 de dezembro de 1960, o comprador Duilio Spiandorim procede com o registro do loteamento Jardim Edite, onde hoje residem aproximadamente mil famílias.

Destino nas mãos da Justiça

Se a Justiça acatar a desapropriação da área, os atuais proprietários terão de deixar as suas propriedades que serão entregues, gratuitamente, aos mesmos herdeiros da família Pereira Braga que em datas anteriores foi quem a vendeu. 

Em resposta ao questionamento da antropóloga Roberta Silva Martins – descrita no processo no Incra – sobre o tamanho da área que se diz Quilombola, a presidente da Associação Quilombolas Mesquita, Sandra Pereira Braga, disse que “os mais antigos (…) meu avô, falam em 600 alqueires, mas acho que hoje não é tudo isso”. Ou seja, 2,7 mil hectares. 

Na demarcação do Incra, a delimitação da área é de 4,2 mil hectares, avançando para outras propriedades que nunca perteceram à Fazenda Mesquita e, muito menos, à família Pereira Braga. 

No entanto, aos proprietários que serão desapropriados, está assegurado o direito constitucional (artigo 5º, XXIV) da justa e prévia indenização em dinheiro que, levando-se em conta o preço médio praticado na região, o valor total a ser desembolsado pelo Incra deverá ser superior a R$ 4 bilhões. 

O JBr. procurou a presidente da Associação Quilombolas Mesquita, Sandra Pereira Braga, para repercutir as queixas dos moradores à legitimidade a sua associação, mas ela não retornou as ligações.

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