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Escolha de Trump, o juiz Kavanaugh é discreto, mas ameaça direitos sociais

Arquivo Geral

16/07/2018 8h00

REUTERS/Joshua Roberts/

Eduardo Brito
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Que o futuro de muitas questões cruciais estará nas mãos do juiz Brett Kavanaugh, caso confirmado na Corte Suprema dos Estados Unidos, todos sabem. O indicado de Donald Trump deve ficar com a vaga de Anthony Kennedy, que mesmo sendo extremamente conservador em questões de economia e política, apoiou a liberação do aborto e evitou avanços do fundamentalismo religioso.

Aos poucos, fica claro que o Senado deverá confirmar a escolha de Trump. Embora a maioria dos republicanos seja de apenas duas cadeiras, há mais possibilidade de que o time de Trump garimpe votos entre cinco democratas de estados caretas do que perca as duas únicas republicanas potencialmente rebeldes.

Mas não dá para se enganar a respeito de Brett Kavanaugh. Decisões anteriores tomadas por ele como juiz do Circuito de Apelações (tribunal superior de lá) do Distrito de Columbia atestam sua solidez conservadora.

Mesmo nunca tendo julgado questões centrais relativas ao aborto – um dos motivos para sua escolha, pois postura mais radicais o fariam perder até votos republicanos – decisões sobre questões envolvendo custeio de saúde expõem visões de Kavanaugh sobre aborto.

Kavanaugh já recebeu apoio de grupos anti-aborto e sem dúvida terá de votar em novas tentativas de limitar ou derrubar a decisão Roe versus Wade , de 1973, que confirmou o direito constitucional ao aborto. Também correm risco os direitos da esfera LGBT e o programa de saúde que atende os mais pobres.

Mesmo sendo juiz, Kavanaugh é membro ativo da Sociedade Federalista, grupo que apoiou Trump, inclusive ao organizar o governo. O vice-presidente executivo da Sociedade, Leonard Leo, é membro do conselho do grupo anti-aborto Students for Life of America.

No ano passado, em um caso federal de grande repercussão, Garza versus Hargan, que julgou se um menor imigrante sem documentos americanos deveria ter acesso a um aborto, a maioria do tribunal reconheceu esse direito. Kavanaugh discordou. Da pior forma.

“A maioria (dos juízes do tribunal) reflete uma filosofia de que imigrantes ilegais têm direito ao aborto imediato quando solicitados, sem sofrer interferência nem mesmo dos esforços do governo para ajudar os menores a superar uma situação inegavelmente difícil e transferindo-os rapidamente para seus países de origem”, escreveu Kavanaugh.

Em um outro caso julgado apresentado em 2015, Priests for Life versus Departamento de Saúde, uma organização católica entrou com uma ação contra o governo Obama relacionada a uma norma do sistema de saúde (conhecido como Obamacare e odiado pelos conservadores) que exigia que a maioria dos empregadores cobrisse gastos com contracepção. Os religiosos não queriam.

Kavanaugh declarou que o Obamacare colocou um fardo substancial sobre as crenças dos empregadores religiosos mesmo “se as organizações religiosas estão equivocadas em pensar que este esquema as torna cúmplices na facilitação da contracepção ou aborto.”

Conquistas que poderão desmoronar aos poucos

Antes de se tornar juiz federal, Kavanaugh contribuiu em 1999 para candidatos que se opunham ao aborto, incluindo o senador republicano Orrin G. Hatch, de Utah, e o direitista furibundo Henry J. Hyde , ex-membro do Illinois GOP House, deputado que foi o paladino do impeachment de Clinton.

É verdade que mesmo juízes conservadores admitem que o caso Roe versus Wade se incorporou de tal forma ao direito norte-americano que não faria sentido revogá-lo. Mesmo assim, Kavanaugh poderia desempenhar um papel crucial na decisão de casos futuros relacionados ao aborto e outros temas caros aos ultraconservadores, como a lei de assistência médica.

Um caso que poderia afetar o aborto pode ocorrer se o estado de Indiana, outro conservador, recorrer da decisão do tribunal que determinou que o estado não pode proibir um aborto após o diagnóstico de síndrome de Down.
Outro caso a ser observado, um desafio a uma lei estadual que proibiria um método comum de aborto no segundo trimestre da gestação conhecido como dilatação e evacuação, poderia emergir do 5º Circuito no Texas. Caso essas ações cheguem à Suprema Corte, o voto de Kavanaugh pode ser decisivo. Assim, Roe versus Wade e o direito ao aborto poderiam desmoronar aos poucos.

Centenas de planos de saúde também estão processando o governo por causa de um dos programas da lei, conhecidos como corredores de risco, que estabilizam os lucros entre planos que registram membros mais doentes do que o esperado e aqueles que terminam com membros mais saudáveis do que o esperado. Pode vir daí um golpe fatal no Obamacare.

Saiba mais

Embora tenham maioria, com 51 senadores contra 49, os republicanos enfrentam um problema. É que ao menos duas senadoras republicanas, Lisa Murkowski e Susan Collins avisaram que não votarão em um juiz que contribua para derrubar a decisão Roe versus Wade, que liberou o aborto no país. Mesmo que os republicanos consigam apoio de dois ou três democratas conservadores, correriam risco.

Para complicar, mesmo que não revogue Roe versus Wade, uma maioria conservadora poderia minar essa decisão, ao permitir, por exemplo, que estados de maioria evangélica deixem de fazer abortos. As senadoras pedirão garantias, embora já tenham sinalizado apoio.

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