Menu
Brasília

Projeto viário entre Samambaia e Plano Piloto volta com força total

Arquivo Geral

14/01/2019 7h00

Redes de alta tensão são o grande entrave do projeto e precisam ser realocadas. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Jéssica Antunes
[email protected]

Uma nova pista, de 26 quilômetros de extensão, que cruza o Distrito Federal de Samambaia até o Plano Piloto. Que desafogue o trânsito e promova desenvolvimento de moradia, comércio e lazer. O governador eleito Ibaneis Rocha (MDB) quer tirar do papel o projeto bilionário que anda a passos lentos há mais de duas décadas e já foi atrás de verba. Para viabilizar o empreendimento, porém, é preciso enterrar toda a extensão dos fios de alta e média tensão de Furnas. Especialista vê problemas na execução do plano.

A Via Interbairros está prevista desde o Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) de 1997. Em 2009, o projeto foi consolidado. A ideia é fazer uma via de ligação até o Setor Policial Sul, no Plano Piloto, passando por Taguatinga, Águas Claras, Park Way e Guará. O grande e principal problema é a necessidade de enterrar a linha de transmissão que ocupa terras do GDF e da Terracap.

Com isso, uma via urbana será liberada. Além das pistas para veículos, a proposta é que se promova o desenvolvimento de empreendimentos imobiliários destinados a moradia, ao comércio e ao lazer. Na gestão de Rodrigo Rollemberg (PSB), o plano foi rebatizado de Transbrasília e o projeto caminhou, a passos lentos, nos últimos quatro anos.

Estudo

Em março de 2017, o GDF recebeu um único estudo para a parceria público-privada, por meio do Procedimento de Manifestação de Interesse. Desde então, diversos órgãos do Executivo avaliam se o projeto será ou não levado adiante.

A papelada estava sob os olhares do Escritório de Parcerias Público-Privadas da Secretaria de Estado de Projetos Estratégicos e demais órgãos envolvidos, com o auxílio do Escritório de Serviços para Projetos da Organização das Nações Unidas (Unops). É a Secretaria de Mobilidade a responsável por avaliar a estrutura viária do projeto e optou por contratar uma consultoria, em andamento há sete meses.

A contratação foi necessária porque a pasta “não tem efetivo para elaboração de análises e estudos técnicos da solução viária de engenharia, serviços preliminares, abastecimento de água, esgotamento sanitário e energia, com a indicação de quantitativos e custos do projeto”, explicou o governo.

Caminho até a execução ainda é longo

Os trâmites finais de orçamento, projeto básico, comissão de licitação, edital e minutas foram encerrados recentemente. Hoje, a Interbairros está em fase de definição dos requisitos técnicos e regulatórios para a minuta do convênio que regulamentará as obrigações das partes quanto aos procedimentos para o enterramento e manutenção das linhas de média e alta tensão de Furnas. A execução de R$ 2,5 bilhão, porém, está longe de sair do papel.

Ainda falta a manifestação do órgão ambiental, a definição dos requisitos técnico-regulatórios para o enterramento, a aprovação do modelo de negócio da parceria público-privada pela Terracap, e a manifestação da Controladoria-Geral e da Procuradoria-Geral do DF.

Depois de tudo isso, o processo ainda precisa ser submetido à deliberação do Conselho Gestor de Parcerias Público-Privadas e, caso aprovado, encaminhado para o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF).

Também pode interferir no andamento a iniciativa do governador Ibaneis Rocha (MDB), que promete suspender e analisar cada PPP firmada nos últimos quatro anos. Apesar disso, ao Jornal de Brasília, o chefe do Executivo diz ter “todo interesse” em tocar o projeto. “É uma pista que vai desafogar o trânsito na Epia e beneficiar moradores do Park Sul, no entorno do ParkShopping, e motoristas que trafegam entre Plano Piloto, Guará e Taguatinga”, diz o governador.

De acordo com ele, a equipe de transição manteve contato com a Aneel, que é responsável pela linha de transmissão que passa no trajeto da via, e busca recursos para tirar o texto do papel. O emedebista se reuniu com o então ministro de Minas e Energia e pediu auxílio para o enterramento dos cabos de transmissão de energia.

Com apenas uma faixa em cada sentido, a Avenida Vereda da Cruz, em Águas Claras, fica ao lado de onde a via será construída. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Falta clareza

“O projeto não é novo, mas é apenas uma intenção, porque não há nada implementado”, aponta Benny Schvarsberg, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Planejamento Urbano e Regional e doutor em Sociologia Urbana, o especialista considera interessante a diretriz de integrar e articular várias regiões, mas aponta problemas para tirá-lo do papel.

Para Schvarsberg, há necessidade de aproveitar as áreas de circulação para costurar o tecido urbano, otimizar e racionalizar a via; priorizar a mobilidade para pedestres, ciclistas e coletivos; e enterrar os cabos de energia para liberação de terrenos livres. Mais que isso, ele reclama de falta de clareza do instrumento para viabilizar a obra. O estudioso indica que a melhor forma de fazer a intenção virar realidade seria um procedimento de Operações Urbanas Consorciadas (OUC).

“O desenho da operação nunca foi suficientemente claro e bem definido. Também nunca foi vislumbrado como operação urbana que pudesse beneficiar a população mais que um conjunto de empresas e empreendimentos”, diz. Para ele, caberia uma OUC Interbairros, uma espécie de PPP por meio de projeto urbanístico, que altera parâmetros urbanísticos da área.

“Com isso, o poder público e empreendedores têm responsabilidades definidas em lei e tudo ocorre sob controle da sociedade civil organizada de forma participativa, construindo e controlando socialmente o projeto”, explica.

Melhorias aguardadas

Entre os brasilienses, qualquer possibilidade de desafogar o trânsito caótico dos horários de pico é aclamada. A possibilidade de ter participação popular no andamento do projeto é vista com bons olhos pela técnica em serviços públicos Sônia Rodrigues. A mulher de 62 anos é moradora do Guará e desconhecia a iniciativa de duas décadas. “Nenhum governo está preocupado em fazer uma gestão participativa, em ouvir a população, em trazê-la para as decisões. Aí fazem obras que não são suficientes para atender o cidadão”, considera.

Ao lado da mãe, Leda Ferreira, 85 anos, Sônia calcula que uma pista cruzando as regiões pode facilitar o acesso a locais próximos, que hoje apresentam dificuldade para chegar. “Daqui para Samambaia, nem tem condução direta. Tem que fazer baldeação. Para chegar a Águas Claras é preciso dar uma volta enorme, sendo que está do lado”, exemplifica.

“Do Guará para Samambaia, nem tem condução direta. Para chegar a Águas Claras é preciso dar uma volta enorme, sendo que está do lado”. Sônia Rodrigues, moradora do Guará, com a mãe, Leda. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Lentidão

Essa dificuldade foi assunto da autônoma Ana Luz, 42 anos, com colegas recentemente. “Trabalho por produtividade. Tem dia que não consigo chegar tão rápido aos lugares porque é preciso transitar por acessos difíceis. No fim das contas, acabo perdendo vendas”, reclama. Para ela, outro diferencial é dividir o fluxo com outras vias de ligação, como a Estrada Parque Taguatinga (EPTG), para reduzir os engarrafamentos.

Nessa perspectiva, a expectativa é que o caos seja minimizado em Águas Claras. A diarista Cláudia da Silva, 44 anos, já consegue imaginar a folga para chegar ao trabalho. “Com certeza vai facilitar porque, hoje, para chegar a qualquer lugar é preciso enfrentar muito trânsito”, diz a mulher, moradora do Areal que presta serviços em Taguatinga.

Saiba mais

– Uma Operação Urbana Consorciada (OUC) é um instrumento urbanístico previsto no Estatuto da Cidade. Conforme a Lei Federal nº 10.257/2001, trata-se de um conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo poder público, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados.

– O objetivo é de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental.

– Essas intervenções devem ocorrer de acordo com um marco regulatório, diferente do resto da cidade, definido através de lei específica para cada operação. No DF, ele foi incorporado aos instrumentos propostos no PDOT de 2009.

Linha de transmissão pertence a Furnas. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado