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Brasília

Pacientes acusam médico de deformar rostos e provocar danos irreversíveis

Arquivo Geral

05/12/2018 7h00

Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasília

Ana Lúcia Ferreira
Raphaella Sconetto
[email protected]

Depois de anos, Alexandre Garzon, 35 anos, consegue se olhar no espelho. Apesar de as marcas ainda estarem em seu rosto, elas não lhe causam mais dor, culpa ou raiva. Assim como ele, mais de 40 pacientes denunciam os supostos erros de um médico que atua em Brasília e em Goiânia (GO). Wesley Murakami, ou apenas “Dr. Murakami”, como se apresenta nas redes sociais, promete mudar e melhorar a estética. Mas o que entrega são rostos tidos pelos pacientes como deformados e, em quase todos os casos, com inflamações e danos irreversíveis à aparência.

Passados seis anos, o empresário Alexandre consegue relatar como conheceu o trabalho do médico. Tudo começou em 2012, quando comprou dez sessões de carboxiterapia capilar – tratamento para crescer os fios – em um site de promoções. Ao chegar à clínica de Murakami, localizada no Taguatinga Shopping, outros procedimentos foram oferecidos a ele pelo médico. “Ele começou a ver problema na minha pele, no meu queixo, em todo meu rosto”, conta Alexandre.

Envolvido na conversa do profissional, o homem confiou nos diagnósticos e resolveu fazer a bioplastia facial. “Eu sempre tive muita marca de espinha. Fiz laser, peeling, tudo para tratar. Mas mexer no meu rosto não era uma ideia que tinha passado pela minha cabeça. Ele era bom de lábia e pegou no meu ponto fraco. Disse que eu ia ficar muito bonito e ainda ia tirar as marcas de espinha”, lembra.

Alexandre Garzon foi um dos pacientes do médico Wesley Murakami. Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasília

Bioplastia

A promessa caiu como luva para Alexandre. Seduzido pelo possível resultado, o empresário não pesquisou como era feito o procedimento. Caso tivesse buscado mais informações, saberia que a bioplastia é caracterizada como um preenchimento com o PMMA – polimetil- metacrilato. Por ser um plástico, seus efeitos são irreversíveis e definitivos. Apenas dermatologistas ou cirurgiões plásticos podem prescrevê-lo. A recomendação é de que seja utilizado em casos específicos.
No dia seguinte à consulta, 11 de abril de 2014, Alexandre voltou ao consultório e fez a bioplastia. “Em nenhum momento ele me explicou que era irreversível. Pensei que era como um botox, que vai saindo com o tempo”, argumenta.

Segundo o paciente, na mesma hora o rosto inchou e ficou deformado. Para ir embora, precisou de máscara para tapar a face. “Durante dois meses fui toda semana fazer consulta. Reclamava, questionava o meu rosto inchado, mas ele falava que ia diminuir, que estava inchado por conta do próprio procedimento. Quando percebi que não ia diminuir, procurei ajuda em outro médico”, afirma.

Após os seis anos e tratamentos com corticoide para reparar o erro, o empresário reconhece que seu rosto nunca mais será o mesmo. O queixo e a mandíbula, que antes eram finos, agora seguem o padrão retangular. Para minimizar o efeito, Alexandre prefere deixar a barba crescer. Na pele, quando apertada, é possível sentir as bolas de plástico formadas pelo PMMA.

Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasília

Justiça

Nesse tempo, além de pagar por procedimentos reparadores, o empresário entrou com uma ação na Justiça por danos morais e estéticos. Ele ganhou a causa, mas até hoje nunca recebeu os valores devidos por Murakami. “Na verdade, o dinheiro é muito pouco diante de tudo que passei. O que eu queria não era isso. Por muito tempo me fechei em casa, não saía, não queria mais viver. Eu não me aceitava e não reconhecia a minha identidade”, desabafa.

“Conto tudo isso porque agora não me dói mais. Mas, na época, não conseguia tocar no assunto. Minha filha chegou a me perguntar o por que estava com o rosto grande. Foi muito difícil suportar os olhares. Tive que buscar um psicólogo, porque eu queria me matar. Wesley mudou a minha vida para pior”, sentencia.

Gastos para reparação

Bruna (nome fictício), 25 anos, é atriz e trabalha com a sua imagem. Por isso, sempre teve a preocupação de estar bonita. Até bioplastia já havia feito. “Fiz com um dermatologista e tinha ficado ótimo, com um inchaço mínimo”, avalia. No fim de 2016, ela conheceu Wesley Murakami. “Fui ao consultório dele para fazer outro tipo de tratamento, mas ele começou a fazer minha cabeça, apontando defeitos no meu rosto e o que podia melhorar”, conta.

Curiosa com o tratamento, Bruna pesquisou sobre o médico e encontrou boas referências na internet, como as fotos em que ele divulga nas redes sociais. “Como já tinha feito o procedimento, achava que seria tranquilo. Fui confiante”, relembra. “Durante a bioplastia, comecei a achar estranho. Ele estava aplicando muitas seringas. Acho que colocou umas 12, enquanto o outro médico usou só uma. Tentei ficar tranquila. Pensei que estava usando o PMMA em baixa concentração”, completa.

Durante o procedimento, Bruna passou mal e foi “medicada” com água com açúcar. Ao final, a atriz estava curiosa em saber como estava o rosto. “Pedi para olhar no espelho. Quando vi, estava um monstro. Tive que sair de máscara, mas nem isso tampou o tamanho da minha mandíbula”, relata.

Por já ter feito a bioplastia antes, logo nos dias seguintes ela percebeu que havia algo anormal e procurou a ajuda de outro médico. “O PMMA não sai, mas o outro médico me disse que era para ter calma, que tinha um tratamento com corticoide que diminuía. Também fui a Blumenau (SC) fazer uma cirurgia com um especialista. Gastei, ao todo, mais de R$ 30 mil para fazer raspagem no osso da mandíbula e diminuir o volume”, contabiliza.

Bruna enfatiza que sua crítica não é em relação à bioplastia, mas a Wesley Murakami. “O procedimento pode ser bem feito. Acontece que ele é mau-caráter. Se importa apenas com o dinheiro e coloca muito produto. Não é normal ele ver que tem esse tanto de pessoas insatisfeitas e continuar fazendo. Só quero que ele pare”, dispara a atriz.

Paciente se submeteu a procedimento estético. Foto: Raianne Cordeiro/Jornal de Brasília

Aceitar a nova identidade

Outra paciente, Camila (nome fictício), 37 anos, optou por não fazer mais nenhum procedimento estético desde que saiu com um novo rosto do escritório de Murakami em Goiânia. “Não tenho coragem de mexer em nada. Com o tempo melhorou um pouco, porque não está mais inflamado, mas ainda dói. Quando vou cumprimentar alguém e os rostos encostam, a maçã da minha bochecha dói a ponto de escorrer uma lágrima”, descreve.

Após o trauma, ela encontrou coragem na religião e no apoio de familiares e de psicológicos. “Eu não estava me aceitando, não saía de casa. Quase cometi suicídio porque estava muito depressiva”, revela. “Tem três meses que voltei com a minha rotina. Estou me aceitando mais com o novo rosto. Entendi que minha vida não podia parar, porque tenho dois filhos e tenho que estar presente na vida deles. Venci com apoio das pessoas que estão a minha volta”, acrescenta.

 

“Eu estava horrorosa”

O sofrimento de Camila começou no início de 2017. Ela conheceu o trabalho de Murakami após uma colega de indicá-lo. “Marquei consulta e ele me disse que cobrava R$ 35 mil para a bioplastia de todo o rosto. O preço era muito alto e eu não conseguia pagar. Fui embora, mas no outro dia ele me mandou mensagem perguntando quanto eu conseguia pagar. Eu disse que tinha cerca de R$ 20 mil e ele falou que faria por esse preço”, lembra.

No mesmo dia, ela voltou ao consultório para negociar os valores, mas foi atraída para fazer o procedimento logo. “Ele me deitou na maca, começou a aplicar anestesia e a injetar o PMMA. Comecei a sentir um incômodo, como se meu olho fosse sair. Mas ele disse que era normal. Comecei a tremer e me trouxeram um cobertor. Desmaiei duas vezes. Quando acordei, a assistente estava me trazendo água com açúcar. Ele insistia que era normal”, recorda.

Ao final, Muramaki deu-lhe um espelho e mostrou o resultado. “Fiquei aterrorizada. Estava horrorosa”, exclama. Camila retornou para casa e passou a trocar mensagens com o médico. Ela voltou ao consultório por mais duas vezes e teve de ouvir que o resultado não estava bom porque ela estava gorda. Quando se deu conta do problema que havia entrado, deixou de frequentar e falar com o médico. “Deixei de lado porque fui cuidar da minha saúde. A única coisa que quero é que ele pare, que não faça isso com mais ninguém. Ele já destruiu muitas vidas”, desabafa.

Veja fotos cedidas por pacientes que se consultaram com o Dr. Wesley Murakami.

Versão Oficial

A reportagem tentou, por diversas vezes, falar com Wesley Murakami. Apenas o advogado de defesa dele, André Bueno, atendeu às ligações. Segundo o advogado, existe uma única denúncia contra o médico em Goiânia. Bueno desconhece qualquer denúncia em Brasília. “Estive nesta semana com o delegado da 4ª Delegacia de Polícia de Goiânia. Fui buscar informações e me inteirar das acusações. Lá, existe apenas um boletim de ocorrência feito em julho, por uma paciente que se diz insatisfeita com o resultado da bioplastia”, comenta. Segundo Bueno, o delegado ainda abriria um inquérito. “Levei registro médico, comprovante de endereço. Estou à disposição do delegado para que possamos solicitar fotografias e exames”, assegura. Questionado se o cliente seria capacitado para realizar os procedimentos estéticos, o advogado alegou que a bioplastia e outros tratamentos oferecidos por Murakami não requerem especialização. “Doutor Wesley não é cirurgião. Ele é médico e para esses procedimentos não é necessário ter especialização. O importante é verificar que ele é capacitado como médico e que usa produtos permitidos por lei”, conclui.

Wesley Murakami ou “Dr. Murakami” . Foto: Reprodução


Saiba Mais

Repórter do Jornal de Brasília se consulta com médico denunciado e relata detalhes da experiência.

Após o fechamento da edição impressa do JBr., o médico Wesley Murakami fez uma postagem em sua rede social. No Instagram, o profissional publicou que está surpreso com as últimas notícias, mas consciente do seu amor, ética e cuidado em exercer a profissão que escolheu.

Murakami diz que seus advogados estão acompanhando os casos apresentados e que, no momento oportuno, irá esclarecer cada questão.

 

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❗❗Boa noite! Quero agradecer a todos pelo carinho e apoio que tenho recebido nesses dias. Ainda estou surpreso com as últimas notícias, mas consciente do meu amor, ética e cuidado em exercer a profissão que escolhi. São 15 anos me dedicando a este trabalho que tanto amo e me preocupando com a autoestima e bem-estar físico e mental de cada paciente. … Meus advogados estão se informando sobre as denúncias que foram formalizadas e com certeza vamos esclarecer todos os fatos e resolver cada questão. Algumas pessoas têm cobrado uma resposta diante de tantas acusações, no entanto, há momento pra tudo. Na hora certa vou me pronunciar oficialmente, mas antes, preciso saber quais são as denúncias e os casos envolvidos. Assim que for informado sobre cada um deles, vou esclarecê-los individualmente. Quero contribuir com tudo que for possível para o bom andamento das investigações e do processo. Se for confirmado qualquer erro médico da minha parte, estarei pronto para auxiliar da maneira que o judiciário entender ser a mais justa. Com certeza, minha intenção nunca foi deixar qualquer paciente insatisfeito, ao contrário. … Nos próximos dias teremos um desenrolar dos fatos e assim que possível comunicarei vocês! Mais uma vez, obrigado a todos meus pacientes que acreditam no meu trabalho, amigos e familiares. Dr. Wesley Murakami

Uma publicação compartilhada por Dr. Wesley Murakami Oficial (@wesleymurakami) em

 

 

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