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Brasília

Morro da Cruz: acidente com operário expõe riscos na construção de cisternas

Arquivo Geral

17/08/2017 7h53

Trinta militares participaram do resgate, além de três retroescavadeiras, um trator e dez viaturas. Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Manuela Rolim
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A operação de resgate do corpo de Raimundo Nonato dos Santos, 52 anos, levou pelo menos cinco dias de intenso trabalho do Corpo de Bombeiros. Até o fechamento desta edição, às 22h40, a expectativa da corporação era concluir o serviço em pouco tempo. No último sábado, a vítima caiu em uma cisterna de 20 metros no setor de chácaras do Morro da Cruz, em São Sebastião.

O incidente serve de alerta para a prática do serviço informal no endereço e, mais do que isso, coloca em prova a fiscalização da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do DF (Adasa). Há mais de 6 mil poços cadastrados no DF.

Os bombeiros trabalharam na presença de familiares e de muitos curiosos. No total, 30 militares, sendo 15 treinados para esse tipo de situação, participaram do resgate, além de três retroescavadeiras, um trator e dez viaturas. Por volta das 18h, os socorristas alcançaram os 18 metros de profundidade com a ajuda das máquinas. A partir disso, no entanto, os homens cavaram manualmente até localizar a vítima. A corporação ainda contou com a ajuda de amigos da vítima.

Versão oficial

Responsável pela vigilância do uso de recursos hídricos, a Adasa assumiu que, nessa ocorrência, não havia fiscalização no local. “Como não foi apresentado o endereço do empreendimento, não podemos afirmar que a perfuração era ilegal. Entretanto, quando o usuário solicita autorização, constitui obrigação informar à Adasa a data da ação para acompanhamento da agência caso seja necessário”, informou a assessoria do órgão. O poço é permitido em áreas não atendidas pela Caesb.

Instabilidade

O supervisor de área do Corpo de Bombeiros, major Isaac Barbosa, detalhou as dificuldades da ocorrência. “A região é muito instável. Tivemos que fazer um trabalho de rebaixamento do solo devido à grande quantidade de terra e também para garantir a segurança da equipe. Portanto, apesar de ser um poço linear, tivemos que lateralizar a nossa entrada para evitar desmoronamento.

O problema é que isso leva tempo. Estamos falando de 20 metros cúbicos. Além disso, tivemos que fazer um trabalho de esgotamento do solo por causa do lençol freático, que foi aflorado. Na prática, é o controle do nível de água”, explicou. O major recomendou ainda que qualquer serviço de escavação seja feito por uma empresa especializada. “É um trabalho perigoso”, completou.

Outro bombeiro apontou a falta de equipamentos de segurança. “Suponhamos que a vítima tenha caído de cabeça para baixo ao descer as manilhas. Para piorar, não estava equipado de forma adequada. Se tivesse caído em pé, provavelmente não teria morrido. A água e a lama teriam amortecido”, acrescentou o sargento Rômulo Rosa.

Outros desistiram do serviço pelo perigo

A abertura irregular de poços artesianos é comum na região. Segundo testemunhas, no dia da ocorrência, uma moradora teria contratado empresa para cavar o buraco. Depois, combinou de pagar R$ 80 para Raimundo colocar as manilhas. Ele trabalhava em uma firma especializada, mas costumava fazer “bicos”, informou o comerciante Pedro de Sousa Santos, 47, irmão da vítima.

“Depois da cisterna aberta, a dona da casa contratou uns rapazes para colocar as manilhas, mas eles não tiveram coragem. Chegaram a descer, mas desistiram por causa do perigo. Em seguida, indicaram meu irmão. Foram atrás dele em um bar e lhe fizeram a proposta. Ele aceitou na hora e foi direto para o local. Chegando lá, disse para a proprietária que, se dependesse dele, ela já teria água naquele dia e ela até comemorou. Depois do acidente, ficou arrasada. Ela não tem culpa, foi uma fatalidade”, relatou.

Pedro explica que o irmão morreu no momento em que desceu para checar se as primeiras manilhas haviam sido colocadas da maneira correta. “Elas precisam estar bem encaixadas para não quebrar. Ele se desequilibrou, ainda tentou segurar na corda. Só foi possível ouvir um único grito, depois o silêncio tomou conta”, concluiu.

Piauiense, Raimundo morava sozinho em São Sebastião e era afastado da família. “Depois do término de um relacionamento, ele se isolou. Era uma pessoa maravilhosa. Fazia esses bicos até para ajudar os moradores. Não sabia dizer não. Era bom para todo mundo, só era ruim para ele mesmo. Não se cuidava, bebia, fumava”, lamentou outro irmão, o auxiliar de produção Cícero de Sousa Santos, 47.

Um terceiro irmão, o auxiliar administrativo João de Sousa Santos, 64, acrescenta que a demora no resgate aumentou o sofrimento: “Só queremos sepultá-lo”.

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