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Brasília

Drogas explodem entre jovens com deficiência intelectual

Arquivo Geral

30/03/2017 6h00

Facilidade de obter drogas, a falta de estrutura social e familiar e a rápida indução ao uso são alguns dos principais fatores do problema. Foto: Kléber Lima

João Paulo Mariano
Especial para o Jornal de Brasília

Leidy (nome fictício) se envolveu com as drogas aos 13 anos. A soma de um ambiente propício e a deficiência intelectual resultou em uma combinação explosiva. A adolescente, que aos 14 engravidou de um dos homens aos quais oferecia programas para sustentar o vício, é um dos casos que, segundo a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais DF (Apae-DF), ocorrem com mais frequência nos últimos seis ou sete anos. Jovens com deficiência intelectual estão em contato cada vez mais frequente com entorpecentes. A facilidade de obter drogas, a falta de estrutura social e familiar e a rápida indução desses adolescentes ao uso são alguns dos principais fatores que levam ao problema.

“É uma aflição, pois vemos todos os passos do problema, desde o início do envolvimento. A nossa briga é para que as pessoas abram os olhos para o que está ocorrendo”, Sheila Pereira, assistente social

A jovem Leidy está desaparecida desde dezembro de 2015. A última vez que os pais a viram foi no Itapoã, onde morava com três irmãos e o filho, que hoje tem três anos. O caso foi denunciado à Polícia Civil, mas até então não há informações sobre o paradeiro dela. A assistente social da Apae-DF, Sheila Pereira Oliveira, acompanhou o caso e afirma que tentou fazer de tudo, junto aos pais, para tirar a jovem do envolvimento com a maconha e o crack, mas não foi possível.

Não há controle

  • Procurada, a Secretaria de Trabalho, Desenvolvimento Social, Mulheres, Igualdade Racial e Direitos Humanos (Sedestmidh) informou que não tem um recorte de atendimento às pessoas com deficiência e dependência química.
  • Dentro do governo, o problema é tratado apenas na rede de saúde pública. No entanto, a secretaria em questão possui uma rede de atendimento à pessoa com deficiência, que funciona na estação do metrô da 112 Sul, a Estação da Cidadania.

“A vulnerabilidade dos deficientes para a droga é muito grande. Eu não sei o grau de entendimento que a pessoa tem sobre o que aquilo faz com ela. Às vezes, ela não entende esse prejuízo”, alega Sheila. Em geral, os deficientes que se tornam usuários são aqueles com menos prejuízo intelectual.

Com a frequência de novos atendimentos, percebeu-se que, além do uso, os adolescentes são muito utilizados como “aviões” – encarregados de entregar pequenas remessas. A droga mais utilizada seria o crack, por ser barata e acessível. Mesmo sem dados oficiais, os profissionais da Apae já recorreram diversas vezes ao Conselho Tutelar e à polícia para informar o uso ou o porte de drogas.

Envolvimento

“A inclusão social é uma vitória para a pessoa com deficiência. Porém, ela é uma das causas para o aumento do uso de drogas. Os deficientes têm mais contato com os problemas de todos os jovens, e um deles é o vício”, explica a coordenadora-geral pedagógica da Apae-DF, Cecília Alecrim. Isso acontece justamente pela facilidade de influenciá-los. As vítimas são, em especial, de baixa renda, pois o acompanhamento diminui e há mais liberdade.

A grande reclamação é que o não existiria apoio do governo para esses casos. A maioria das casas de recuperação não aceita os jovens sob a alegação de que não saberiam tratar de uma pessoa com deficiência. Para completar, não existiria suporte governamental.

“É uma aflição, pois vemos todos os passos do problema, desde o início do envolvimento. A gente tenta resgatar a família, que, em geral, se encontra em momento difícil. A nossa briga é para que as pessoas abram os olhos para o que está ocorrendo com esses deficientes. O que será dessas pessoas? Precisaria de mais políticas públicas para abranger essa parcela da população”, alerta a assistente social Sheila Pereira Oliveira.

Vício levou a furto e à prisão na Papuda

Wagner (nome fictício) tem 20 anos e está preso na Papuda por furto desde agosto do ano passado. O jovem é deficiente intelectual e começou o uso de drogas aos 14 anos. Renata (nome fictício), a mãe, chora ao lembrar que um vizinho da família, quando moravam em Santa Maria, ofereceu a primeira porção ao menino. Ele utilizava, ao mesmo tempo, os entorpecentes e remédios controlados para amenizar os problemas da deficiência.

Renata visitou o filho na quinta- feira passada e diz que ele está bem. Agora, não usa mais drogas e até participa de encontros religiosos no presídio. Para a mãe, que já enfrentou traficantes para resgatar o filho na boca de fumo, é difícil vê-lo na situação em que está, mas entende que ele não está pronto para voltar à rua.

“Em nenhum momento tratei meu filho diferente dos outros. Só tive mais cuidado com ele por ser deficiente. As pessoas tinham muito preconceito. Quando foi preso, eu me perguntei onde errei. Mas, com o tempo, percebi que a gente que é pai ensina, e o mundo ensina outra coisa”, diz a mãe de Wagner, filho mais velho de quatro.

Apoio

Para ela, o apoio encontrado na Apae-DF foi muito importante, pois tentou até internar o menino. Porém, em geral, não aceitam menores de idade em casas de recuperação. Renata espera ter o filho de volta ao lar logo e afirma que nunca o abandonou. Ela sustenta que os pais não podem abandonar os filhos que apresentam esses problemas. A deficiência os deixa mais suscetíveis, mas com amor e carinho é possível vencer. “Nunca vou desistir. Sempre vou lutar”.

Quando adolescente, Wagner era velocista. Chegou a competir em eventos nacionais, mas o uso de drogas o fez perder as competições. Renata acredita que ele vai retomar tudo isso e muito mais. “Se colocá-lo para fazer o bem, ele faz”, reconhece.

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