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Brasília

Crise hídrica: efeito cascata pode abranger comércio e serviços do DF

Arquivo Geral

29/09/2016 7h00

Atualizada 28/09/2016 23h37

Dida Sampaio/Estadao

João Paulo Mariano
Especial para o Jornal de Brasília

A notícia de que a conta d’água das residências, comércios e indústrias pode ter acréscimo entre 10% e 20% não agradou nada a população do DF. A Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do DF (Adasa) propõe a tarifa de contingência quando o nível de um dos dois reservatórios que abastecem o DF chegar a 25%. Apesar de ainda precisar passar por audiência pública – na próxima segunda-feira –, a decisão já recebeu críticas de todos os lados e pode ter efeito ainda pior: levar ao aumento do preço de produtos.

Os reservatórios de Santa Maria e do Descoberto, que abastecem mais de 80% do sistema do DF, estão com os níveis em 47% e 34%, respectivamente. O governo tenta amenizar o problema, já que a chuva dos últimos dias melhorou, mas não modificou a situação por completo. A tarifa de contingência será de 40% para residências convencionais e de 20% para casas populares, comércio e indústria. Na conta final, os primeiros terão aumento de 20% e o outros de 10%.

De acordo com a Adasa, a intenção é reduzir o consumo de água em 15%, o que geraria uma economia de 1,5 milhão de metros cúbicos por mês – o equivalente ao consumo de 460 mil pessoas. A agência garante que, se aplicada, a tarifa terá caráter temporário e deverá ser retirada assim que o estado crítico de escassez acabar. Quem poupar 15% volta à tarifa anterior, e quem poupar mais economiza no valor que pagava antes.

“Não se trata de uma tarifa punitiva, mas uma forma de estimular as pessoas a poupar água”, afirma o diretor-presidente da Adasa, Paulo Salles. A instituição ainda informa que o consumidor que ultrapassar o consumo mensal de 10 m³ (10 mil litros) está sujeito à taxa. Quem utilizar abaixo disso, o que representa 45% dos imóveis do DF, está automaticamente isento de pagar a tarifa a mais.

Críticas

“A gente não apoia essa sobretaxa para indústria. A água no setor é utilizada de forma racional e tem sido feito grande investimento em cima disso. A água na produção industrial é considerada um custo, assim não tem lógica desperdício”, diz o representante da Federação das Indústrias do Distrito Federal (Fibra) no conselho de recursos hídricos do DF, Antônio Carlos Navarro. Para ele, se a taxa vingar, não tem jeito: “Isso leva ao aumento no custo dos produtos”.

O integrante da Fibra relata que, por trás do aumento, há perda da competitividade, pois o Distrito Federal tem taxas altas de impostos e já existe um esforço pra sobreviver a esse fator. “A indústria, de modo geral, por menos consumo que tenha com a água, tem um custo”, afirma o conselheiro.

Ele argumenta que a economia pode ocorrer mais facilmente em residências do que na indústria. E garante que, com aumentos de produtos, o setor perde cliente e mercado. O risco é grande.

Saiba mais

  • A taxa não seria aplicável a unidades com o consumo mínimo, hospitais , clínicas, hemocentros, centros de diálise, prontos-socorros, casas de saúde e estabelecimentos de internação coletiva. Economia implica em redução do valor da tarifa de contingência, e pode até reduzir o valor pago anteriormente pelo usuário.
  • De acordo com a Adasa, o consumo de água no Distrito Federal é maior que o ideal. A média, até julho de 2016, foi de 175,1 litros/habitante/dia. A agência considera que 150 litros/habitante/dia seriam suficientes.
  • A diferença no consumo diário por habitante entre as cidades do Distrito Federal é grande. Os dados da Adasa mostram que as regiões com maior gasto médio diário de água são SIA (481 litros), Lago Sul (437 litros) e Brasília (265 litros). As cidades com menor consumo médio diário são Itapoã (121 litros), Riacho Fundo II (125 litros) e Varjão (132 litros).

Impacto em serviços e também no comércio

Se para a indústria a situação é difícil, para os pequenos comerciantes o repasse do preço para o consumidor é quase inevitável. Antônio Matos, gerente de uma padaria na Asa Sul, afirma que o funcionamento do estabelecimento depende muita da água, tanto para o preparo dos pães como para a limpeza. Ele avalia que um aumento, mesmo em época de recessão e por motivos importantes, dificulta a vida dos que já estão lutando diariamente para sobreviver nesse tempo de economia difícil.

A média do gasto na padaria é de R$ 900 por mês. Se a taxa de contingência for aprovada, ele vai ter que pagar R$ 990, pois ocorrerá um acréscimo de 10% no preço final. Para Antônio, já é demais.

Um salão de beleza que funciona na quadra ao lado, por sua vez, deve desembolsar R$ 60 a mais, já que a conta, em geral, vem no valor de R$ 600. A recepcionista do local, Verônica Fonte, diz que o comércio não aguenta mais aumentos. “É tanto imposto. Não é justo. Utilizamos água para tudo. Unha até dá para ficar sem usar, mas, para os cabelos, é essencial”, diz.

A diarista Ana Rutt Pereira não gosta nem de falar do assunto “aumento”. Ela paga cerca de R$ 120 mensais à Caesb e se incomoda de ter que pagar mais 20%. A moradora de São Sebastião reclama que sofreu com os racionamentos das últimas semanas. Ela tem caixa d’água, mas passou alguns apertos recentemente.

Ana entende que é importante economizar no momento atual e destaca que reutiliza a água da máquina de lavar para higienizar outras partes da casa. Ela faz com que os três filhos ajudem a diminuir o consumo, mas admite ser difícil, já que “adolescentes gastam muito”.

“Mesmo que fosse de graça, eu iria economizar”, expõe o vendedor Ananias Pinheiro, que diz tentar de tudo para gastar menos água. A média mensal é de R$ 60. Ele se preocupa mais com a possibilidade do aumento de insumos do que com a própria conta. O morador do Guará diz que não dá para ter mais acréscimos em nada.

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