João Paulo Mariano
Especial para o Jornal de Brasília
Não é pela Quaresma que a consultora Freda Dias, 36, praticamente deixou de comer carne, frango ou embutidos. Ela está assustada com os resultados da operação Carne Fraca, deflagrada pela Polícia Federal há uma semana. Apesar disso, muitos brasilienses não pararam de consumir a proteína em casa ou em restaurantes.
A ação descobriu uma série de irregularidades que frigoríficos do País cometiam para aumentar a validade dos produtos ou obter mais lucro. Por isso, a consultora Freda não comprará nada das empresas envolvidas até que tudo esteja apurado e todos os laudos saiam. “Pode ser só um estardalhaço, mas, enquanto não tiver certeza, ninguém da minha casa come”, argumenta.
Além desses cuidados, quando pediu carne moída para o açougueiro, Freda deixou claro que era para o homem cheirar o alimento e ver se estava tudo certo. Mesmo assim, não aceitou o produto, pois achou que havia odor forte. “Não posso levar algo assim para minha casa”, afirmou a mulher, deixando a carne no balcão.
Saiba mais
- A operação Carne Fraca ocorreu em seis estados e no DF. Mais de 30 pessoas foram presas e ainda existem foragidos. O Ministério da Agricultura afastou 33 servidores que estavam envolvidos no esquema. Eles faziam vista grossa nas averiguações nos estabelecimentos investigados.
- As buscas foram feitas em 21 frigoríficos que trabalham para várias empresas brasileiras. Há grandes conglomerados envolvidos.
- Uma das informações que mais chamou atenção durante as divulgações foi a da suposta mistura de papelão na carne moída. O Ministério da Agricultura e a empresa responsável pelo produto refutam a afirmação, que, segundo eles, teria relação com o embalamento, não com uma possível mistura.
Por outro lado, a aposentada Alcione Georgio, 67, garante que não mudou nada em sua alimentação e ainda brinca: “Como um mineira vai ficar sem comer carne?”. Apesar de não se preocupar, ela toma o cuidado de olhar as condições do produto no supermercado. A idosa faz questão de comprar no mesmo local há anos, o que ajuda, pois conhece a mercadoria e o açougueiro. Quando encontra algo estragado, sempre volta para trocar.
Leiliana Noronha, 37, é engenheira de pesca – ou seja, conhece a proteína animal e até mesmo os artifícios usados na conservação. Pelo conhecimento que tem, continuou consumindo tudo normalmente. Ela confia nos meios de controle de qualidade e diz que todos os dias alimenta o filho “carnívoro”. Para ela, sem proteína não dá. O que realmente preocupa a engenheira é a forma como a operação foi feita, pois gera “o medo excessivo e até mesmo demissões”.
Movimento contínuo
Setores da economia estão apreensivos. Vários países pararam de importar os alimentos brasileiros. O segmento dos restaurantes já enfrenta crise devido à recessão e tenta sobreviver a todo custo. No entanto, ao menos em Brasília, ainda não houve prejuízo. É o que diz o presidente do sindicato dos Hotéis, Bares e Restaurantes do DF (Sindhobar), Jael Silva. Ele afirma que o único “arranhão” sofrido foi no sábado passado, dia após a operação, quando os clientes preferiram evitar carne ou perguntaram bastante sobre a procedência.
Restaurante sai ileso da polêmica
“Não sentimos mudança de movimento. O pessoal já sabe da qualidade dos nossos cortes, que vêm, em geral, da Argentina ou do Uruguai. Mesmo assim, ao recebemos a carne, prestamos atenção na cor, na textura e no cheiro. A pessoa leiga até pode ter dificuldade, mas nós, que mexemos com o produto todo dia, temos facilidade”, esclarece o chef do restaurante El Negro, Marcello Piucco.
A carne, o frango ou a linguiça fazem parte de 99% dos pratos servidos ali. Peixes, nem em tempos de Quaresma ou de dúvidas quanto à qualidade, não estão em alta.
Piucco dá dicas para consumir um produto de qualidade. Entre elas, sempre procurar comprar de um açougue de confiança, para que a carne esteja in natura, e conversar com o atendente sobre a carne mais recente e de melhor qualidade. É importante observar a textura, pois tem de ser consistente: não pode se desfazer ao ser tocada e precisa ter aparência mais avermelhada. Em restaurantes, a recomendação é buscar locais de confiança, onde se conheça o trabalho da cozinha e, se houver suspeita do produto, pedir para trocar.