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Histórias da Bola
Histórias da Bola

Os Filhos de peixe

Arquivo Geral

28/09/2018 19h35

Pelas as fotografias publicadas por jornais e revistas da década-1960, Pelé e Coutinho não se pareciam tanto, embora alguns jornalistas insistissem nisso, caso da rapaziada da ‘Revista do Esporte’, que brincava de dizer serem os dois “irmãos”, embora ressaltando não haver nenhum parentesco no lance.

A mesma revista contava que a maioria dos torcedores acreditavam nesse “irmandade”, sobretudo porque, naqueles inícios de tabelinhas no ataque santista, os camisas 9 e 10 “andavam sempre juntos, possuem o mesmo estilo de jogo e temperamentos iguais”. Descritos pela semanária carioca por pessoas humildes, seus redatores viam Pelé e Coutinho parecendo, ainda, filhos dos mesmos pais, por um outro motivo: “Reagem de maneira idêntica às perguntas dos repórteres”, escreveram.

Isso tudo, ainda, era pouco nas comparações. O “Rei” e o seu parceiro de tabelinhas eram vistos por pessoas de temperamentos psicológicos parecidos, mostrando-se calmos, tranquilos, vibrando com intensidade durante as vitórias e sofrendo da mesma maneira pelos revezes no placar. É mesma “RevEsp” que registra: “ …os locutores esportivos, muitas vezes, se confundem, não sabendo se determinado gol do Santos foi assinalado por Coutinho ou por Pelé…”

Das matérias jornalísticas mais marcantes sobre a semelhança fisionômica entre os dois craques uma é relatada – a registrada por fotos – de Pelé usando uma braçadeira no pulso direito. Invenção do treinador Lula (Luís Alonso Peres) para a dupla atacante não confundir os companheiros do time.

Se aquilo ocorria na década-1960, meio-século depois, o fato foi lembrado por um dos mais brilhantes jornalistas esportivos brasileiros de todos os tempos, Armando Nogueira, pela crônica “Um olhar… à página 42 do número 325 da revista “Lance A+”. Contou ele: “O goleiro Barbosa, do Vasco da Gama, me confessou, certe vez, que, em jogo noturno, sofria um bocado, querendo saber quem era quem. Os dois entravam na área, vertiginosos, e ele, Barbosa, tentando identificar um e outro. Se matasse a charada a tempo, poderia dar o bote certo. Se o chute saísse de Pelé, seria de um jeito; se fosse por Coutinho, de outro. O disparo de Pelé era mais forte e o de Coutinho mais colocado”.

Armando contou, ainda, que, Coutinho, lá pelas tantas, começou a reclamar das confusões que os “speakers” faziam por conta daquela história, e contou esta: “Estávamos em um programa de TV e o Coutinho chorou que, muitas vezes, o Pelé mandava uma bola lá nas nuvens e o narrador dizia ter sido ele (Coutinho) que perdera um gol feito”.

Para Armando Nogueira, um mestra contador de histórias do futebol, que fazia o que queria com as palavras, Pelé tinha mais jogo de cintura, driblava e passava a bola, indistintamente, enquanto o “colega de inferno” preferia passar. E, por ser mais baixo e gordinho, bola pelo alto não era o seu forte, por carecer de melhor impulsão vertical. “Sucede que… quando os dois vinham tabelando, a identificação era quase impossível. Dezenas de pernas concentradas na disputa, os dois varando tempo, espaço, almas e corpos estranhos – tremendo pesadelo.”

Disso tudo aí surgiu a lenda de que Pelé e Coutinho, quando juvenis e residindo na mesma pensão, ao irem para os treinos do Santos, em vez de pegarem um ônibus, pegavam uma bola e saíam tabelando pelas ruas, via aérea ou rasteira, desviando de carros e de transeuntes, até chegarem à Vila Belmiro – onde deveriam ter driblado o porteiro e entrado, conforme toda lenda que se preze.

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