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Sem Firula

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Arquivo Geral

13/01/2017 7h00

Atualizada 12/01/2017 13h29

Maio de 2001. Eu já trabalhava na assessoria da Confederação Brasileira de Vôlei há mais de dois anos – comecei no fim de 1998. Já coordenara um Mundial de Vôlei de Praia em Salvador; já viajara com a seleção dirigida por Radamés Lattari para a Copa do Mundo do Japão (onde não conquistamos a vaga para os Jogos Olímpicos de Sidney, que só veio depois, num pré-olímpico duríssimo); acompanhara a seleção masculina na dita Olimpíada de 2000…

“Você vai para a primeira etapa da Liga Mundial com o Bernardo…”

A frase, dita (escrita) assim, não causa maiores preocupações. As palavras que vieram depois… “Sabe… Eu já tive problemas com ele, que vai estar estreando, é nervoso… Melhor mandar você”, completou a coordenadora da assessoria. Naquele momento gelei. Se a coordenadora, que já estava “na casa” há quase uma década, estava preferindo afastar-se, o que aconteceria comigo? Mas a perspectiva de acompanhar a estreia de um treinador vitorioso, em novo posto, e o desafio… Fui em frente.

Ciente do jeito de ser dele, não pisei fundo na chegada. Por sorte, um de seus auxiliares, o querido Chico (que mais tarde treinaria a seleção de Portugal), com seu jeito mineiro de ser ajudou na minha adaptação. Com os jogadores não havia problema. Muitos já tinham viajado comigo, já me conheciam – e avacalhavam, ajudando a quebrar o gelo. No primeiro dia de treinos, muitas conversas, distantes dele, e atenção redobrada.

Claro que já havia me apresentado, dito quem era, o que iria fazer. Recebi a programação: treino, treino, treino, vídeo. Intercalado com lanche, almoço, lanche, jantar, lanche. E conversava com Chico. Já estávamos na Holanda, em Groningen, num hotel que se fosse nos Estados Unidos seria chamado de motel por ficar praticamente à beira da estrada – e nós (eu e os jogadores) sempre “completávamos” as refeições que eram oferecidas com mais alguma coisinha no restaurante – aí por nossa conta.

Na noite do terceiro dia, encerrado o jantar, quando todos iam para a sala de vídeo Bernardo me chama. “Vem”, foi sua única palavra. “Mas… Vocês vão para a sessão de vídeos”, foi a minha tímida resposta. “Então… Você faz parte da delegação… Vai querer ficar de moleza?”, provocou-me. Pronto. Estava dada a senha para uma convivência que, naquele período, durou quase um mês. Uma convivência que gerou uma relação que, se não posso dizer de amizade, provoca sorrisos, abraços e apertos de mão seguros sempre que nos encontramos. Conversas variadas, encontros inesperados.

Na Holanda perdemos Marcelo Negrão, numa contusão horrível – que gerou ainda mais inquietude para mim, o assessor de imprensa, único jornalista brasileiro presente e com a obrigação de contar tudo o que acontecia a todos. Felizmente a sorte me acompanhou e, no ginásio, encontrei uma brasileira que trabalhava no hospital da cidade. “Fica tranquilo. Este tipo de tratamento não é especialidade deles, mas ele estará muito bem cuidado. Qualquer coisa peço aos colegas para me avisarem e te digo”, tranquilizou-me a nova amiga.

Com estas informações dirigi-me ao grupo, num intervalo, e todos ficaram mais tranquilos. “O assessor é bom”, brincavam os jogadores. O sorriso tímido de Bernardo era mais do que a concordância e motivo de orgulho. Eu era, sim, parte da delegação. No dia seguinte Negrão embarcou para o Brasil. Nossa primeira e mais sentida baixa.

Da Holanda fomos para a Alemanha. No aeroporto holandês, atrasados, eu e Renan (este mesmo, que agora assume a equipe no lugar de Bernardo) demos uma “passaportada”. Tumulto geral e Renan pega seu passaporte italiano e esbraveja contra o tratamento dado “a um cidadão europeu”. Na aba, faço o mesmo. Diante do desespero dos holandeses, passamos todos, jogadores e comissão técnica, e entramos no voo que nos levaria a Berlim, para mais dois jogos.

Na capital alemã, nossa segunda partida foi num domingo de manhã. Teríamos a tarde e a noite livres antes de embarcar para os Estados Unidos. Nunca estivera em Berlim e perguntei a Bernardo se ele liberaria o ônibus que estava à disposição da equipe (para fazer os deslocamentos para os treinos e jogos) para um tour pela cidade – com os jogadores, que eram presença obrigatória para o ônibus circular. “Por mim tudo bem, mas duvido que eles topem”, respondeu-me. Conversei com a galera e apenas um disse que não iria. “Mas fala que eu vou, porque aproveito e me encontro com os empresários para fechar meu novo contrato”, pediu-me. Claro que seu nome não será revelado. E lá fomos nós para um tour pela capital da Alemanha já unificada, tirando fotos (todas perdidas) nos restos do Muro e encontrando brasileiros em toda a parte. Jogamos, ganhamos e ainda nos divertimos.

Na última parada, no Colorado, algumas roubadas, como um jantar no estilo “velho oeste”, em pratos de alumínio, sujos de gordura (aí não era estilo, não, era sujeira mesmo) e direito, para mim, a uma saída noturna com a tenente da base onde treinávamos, para surpresa dos jogadores (que estavam sob rigoroso regime de concentração e treinamento) e minha doce vingança – quando a loirinha, que todos davam apenas “good morning” quando chegavam para treinar, desceu do carro e com um sorriso me chamou para nossa noitada, eles, jogadores, que esperavam para a sessão de vídeo (eu fui liberado por Bernardo, que já sabia do programa), ficaram se perguntando como isso acontecia.

Não estive na fase final, mas o Brasil foi campeão. O primeiro de uma série enorme de títulos sob o comando de Bernardo. Vários acompanhei, depois, não mais como assessor da CBV. Alguns até como repórter/colunista do Jornal de Brasília. Agora ele pede um tempo. Será substituído por um amigo. Valeu por tudo.

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