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Coluna D

Fake news. A culpa é sua.

Arquivo Geral

22/10/2017 18h18

Diana Leiko

Fiquei um tempo sem postar. Há uma justificativa, aliás, há várias. Mas destaco a mais importante: criar um pensamento próprio leva tempo.

Meu intuito aqui é escrever sobre o que penso, a partir das leituras que faço e, quem sabe, provocar uma reflexão em quem lê meus textos.Mas para fazer uma análise sobre qualquer que seja o tema, preciso ler livros, artigos, assistir a documentários, vivenciar situações.

Confesso que a cada vez que demoro a escrever, vou virando uma espécie de esponja que, chega uma hora, não consegue mais absorver nada. Fica difícil de digerir e aí é o momento de botar para fora. Por isso estou aqui hoje, após passar mais de um mês ausente.

Como diz Leonardo Sakamoto em seu livro “O que aprendi sendo xingado na internet”: “Fácil é escrever o que o senso comum deglute com facilidade e que está guardado em nossos instintos mais animais. Difícil é redigir algo com a certeza absoluta de que apenas uma minoria vai ler o texto até o final e, daí, refletir”.

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E aí entro no assunto que me fez estar aqui neste domingo solitário, barulhento (escuto o murmúrio das cigarras) e quente (cadê a chuva?): notícias falsas, as chamadas fake news. Estamos perdendo a guerra para as fofocas.

Recentemente, a Globonews exibiu documentário sobre o mercado das fake news e o impacto que elas tiveram em eleições como as dos Estados Unidos. Mostrou, em detalhes, como os chamados “Veles boys” montaram sites usando publicadores simples como o WordPress, instalaram neles diversos espaços de banner com a ajuda do Google AdSense, publicaram informações absurdas sobre políticos americanos e encheram os bolsos com publicidade.

De acordo com o documentarista André Fran, Christian – sozinho – embolsava uma média de 20 mil euros por mês durante a campanha eleitoral dos Estados Unidos. Esse dinheiro agora vai pagar sua faculdade na Holanda. Christian quer estudar “gerenciamento de mídias sociais”.

Mas teve algo nesse documentário que me chamou especial atenção: o posicionamento do jovem de apenas 19 anos. “Eu acho que a internet sempre foi esse espaço livre. As notícias falsas existem desde o início da internet. Os leitores devem estar atentos ao que leem. Se você acredita em notícias falsas, a culpa é sua. As pessoas deveriam perceber que estão lendo coisas falsas”.

Foi então que eu parei para observar o outro lado. Fala-se muito em disseminação de informações falsas, boatos, fofocas. Culpa-se quem fomenta esse tipo de “notícia”, mas esse mercado só existe porque tem demanda. Nós, que não usamos o benefício da dúvida, somos responsáveis por isso.

Nós temos culpa sim por nos informarmos mal e porcamente. Por acreditarmos em fontes duvidosas. Por sequer checarmos a veracidade dos fatos. E é tão simples! Basta jogar no Google e verificar se outras fontes também publicaram e quais fontes são essas. Se ainda assim tiver dúvida, é mais simples ainda. Fique calado. Não abra a boca para se manifestar nas redes na tentativa quase desesperada de querer sustentar sua máscara de pseudointelectual.

“Somos nós que semeamos muito do que, posteriormente, será colhido, consumido e usado – seja na discussão do futuro do país, seja em uma conversa despretensiosa em bar” (Leonardo Sakamoto). Então, é importante refletir sobre o nosso papel na disseminação de boatos e não simplesmente e confortavelmente transferir a culpa para quem cria notícias falsas.

Você, que lê o título das notícias publicadas nos perfis dos seus amigos, compra a ideia e compartilha, tem culpa. Você, que só se “informa” pelas redes sociais, tem culpa. Você, que pensa com a cabeça dos outros porque não aprendeu a pensar por conta própria, tem culpa. Você, que fica dentro da sua bolha ideológica em que nada que desafie seu modo de pensar entra, definitivamente tem culpa.

Um exemplo? Os diversos amigos, colegas ou conhecidos meus que vi desfazerem amizades na rede do Zuckerberg com pessoas que pensavam diferente deles, na época do impeachment da Dilma.

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Sobre essa questão das bolhas, o algoritmo do Facebook filtra o que é mostrado para, em princípio, dar ao usuário apenas o que mais lhe agrada ver e não enchê-lo com informações que não lhe interessem tanto. Sendo assim, no nosso feed só aparecem conteúdos que corroboram com nossas ideias.

O algoritmo é o vilão? Não! Somos nós mesmos, que utilizamos esse canal para ressonar nossas próprias ideias, com poucas janelas para o exterior. Nós, hipócritas que pregamos a paz, não sabemos conviver com as diferenças.

A intolerância sempre existiu, as mídias digitais são o reflexo do que sempre fomos. A diferença é que ela mostrou essa realidade. Mas se não desafiarmos nossa forma de pensar, respeitando quem pense diferente de nós, perderemos a capacidade de dialogar e ajudaremos a tornar esse mundo muito pior.

Ainda em referência ao Sakamoto, conter “a propagação de boato talvez seja um dos maiores desafios que teremos nos próximos anos. O futuro de um mundo em que todos têm ferramentas em massa ao seu alcance, mas ninguém se importa com a veracidade do que (re)publica, passa por uma educação para a mídia. Por ensinar crianças e jovens a terem responsabilidade sobre o conteúdo que divulgam”.

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